Vocês já viram a morte. Já
viram pessoas morrerem e serem transportadas para o túmulo, mas não sabem o que
significa morrer, sabem? Vocês têm teorias e crenças a respeito da morte, cobre
o que acontecerá depois da morte ou dizem: “Acredito na reencarnação”. Todos
vocês acreditam na reencarnação, não?
Vozes: Acreditamos.
Sabem o que isso significa —
reencarnação? Escutem, bem quietos. Vocês adotaram a suposição de que, após a
morte, vocês renascerão;
acreditam nisso. O que é “vocês”? — O dinheiro depositado no banco, a casa, o
emprego, lembranças, disputas, ansiedades, dores, medo — “vocês” não são tudo
isso? Negam que isso seja “vocês”, dizendo que o “eu” é muito superior a essas
coisas? Se dizem que o “eu” não é o seus móveis, suas famílias, seus empregos,
mas uma coisa infinitamente superior, quem é que o diz, e como sabem que
existe “uma coisa infinitamente superior”? O pensamento é quem o diz e,
portanto, essa coisa “infinitamente superior”, esse “superego”, esse Atman,
está ainda no campo do tempo, no campo do pensamento, e o pensamento é “vocês”
— seus móveis, sua conta bancária, seu apego à família, à nação, a seus livros,
a seus desejos impreenchidos. Se realmente acreditassem — com o coração e não
com a mente desprezível de vocês — que na vida futura reencarnarão, estariam
vivendo hoje de maneira totalmente diferente, porque, pelo que hoje fazem, terão
de pagar amanhã, na “vida futura”.
Ao morrerem, perderão o saldo
bancário, pois não poderão leva-lo com vocês; poderão retê-lo até o último
minuto, e a maioria das pessoas quer retê-lo até o último instante — é de fazer
rir, não? Assim, como realmente não sabem nada sobre a morte, vamos aprender o
que ela é — aprender, e não apenas repetir o que o orador diz, porque, se o
repetirem, verão que são meras palavras — nada.
O organismo físico, decerto,
perecerá. O cientista poderá dar-lhe mais uns cinquenta anos, ao fim deles, o
organismo morrerá, porque está sendo submetido a constante uso e abuso. O organismo
vive sujeito a tensões e pressões de toda espécie; dele se abusa com bebidas,
drogas, comidas impróprias, incessante luta. Tais excessos cansam o organismo,
de onde os colapsos cardíacos, as doenças, etc.
O corpo perecerá, e que mais
morrerá com ele? Sua mobília, seu saber, suas esperanças, desesperos e
preenchimentos. Que é, pois, a morte? Aprendam, por favor. Estamos aprendendo
juntos. Para descobrirem o que é a morte, devem morrer, não? Se são ambiciosos,
devem morrer para as suas ambições, seus desejos de poder, posição, prestígio;
morrer para os seus hábitos, suas tradições. Compreendem? Não se podem discutir
com a morte, dizer-lhe: “Preciso de mais uns dias, não acabei de escrever meu
livro; quero mais um filho, etc.” Nada se pode alegar; portanto, abstenham-se
de argumentar, de justificar.
Morram completamente para toda
e qualquer coisa: sua vaidade, suas ambições, as imagens que tem de si mesmo,
de seu guru, de sua esposa. Se o fizerem, compreenderão o significado
da morte, saberão o que é uma mente morta para o passado. Só a mente que morre
todos os dias tem a possibilidade de transcender o tempo.
(...) Morram, pois, cada dia,
para conhecerem a beleza da vida, a beleza da Verdade, e não precisaram aprender
nada de ninguém, porque vocês estarão aprendendo.
Jiddu Krishnamurti — Bombaim
14 de fevereiro de 1971