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quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Como proceder para conhecer o genuíno espírito religioso?

Dissemos que existe a beleza, um sentimento do belo inacessível aos sentidos, sentimento não provocado pelas coisas feitas pelo homem ou pela natureza. A beleza transcende tudo isso; e para efetuarmos a investigação da beleza — que não é meramente subjetiva ou objetiva — temos de alcançar o percebimento intenso de beleza que se alcança por meio da meditação. Considero a meditação, a mente meditativa, um requisito essencial. Já examinamos esta matéria com bastante profundeza e vimos que a mente meditativa é aquela que investiga, que percorre todo o processo do pensamento e é capaz de ultrapassar-lhe as limitações.

Talvez, para alguns dentre nós seja dificílimo meditar; e é mesmo provável que não tenhamos sequer pensado nesta questão. Mas quem examina atentamente esta questão da meditação — a qual não é auto-hipnotismo, nem imaginação, nem evocações de visões, e outras infantilidades que tais — alcança, invariavelmente, penso eu, aquele mesmo sentimento, aquela mesma intensidade própria da mente que percebe o belo sem "provocação". E a mente que está em silêncio, tranquila, naquele estado de intensidade, descobre um estado não limitado pelo tempo e pelo espaço.

Desejo agora falar sobre o significado da mente religiosa. (...) Parece-me que neste nosso mundo atual, onde vemos tanta confusão, aflição e agitação, são necessárias a mente científica e a mente religiosa. Estes dois, sem dúvida, são os únicos estados mentais reais; pois não é real o estado da mente que crê, da mente condicionada, quer pelo dogma do cristianismo, do hinduísmo, quer por qualquer outra crença ou religião. Afinal, temos problemas imensos e a vida se tornou muito mais complexa. Exteriormente, talvez haja um maior sentimento de segurança, o sentimento de que talvez não tenhamos guerras atômicas no futuro, dado o terror que inspiram. Sente-se que, conquanto possa haver guerra em data remota, não será na Europa; e, assim, podemos sentir-nos mais seguros, física e emocionalmente. Mas, parece-me, a mente que busca segurança se torna embotada, medíocre, e, em tais condições, ela é incapaz de resolver seus próprios problemas.

Assim, para vivermos neste mundo — com suas rotinas, seu tédio, a existência superficial da classe média, da classe superior ou da inferior — e resolvermos os nossos problemas, ultrapassá-los, penetrar profundamente em nós mesmos, só há dois caminhos:, dar-lhe o cientifico ou o religioso. O "caminho" religioso inclui o cientifico, mas o cientifico não contém o religioso. Mas necessitamos do espírito cientifico, uma vez que este é capaz de examinar rigorosamente todas as causas da miséria humana; o espírito cientifico poderá promover a paz mundial, objetivamente — alimentar a humanidade, dar-lhe casas para morar, roupas, etc. — não apenas aos ingleses ou aos americanos, mas a todo o mundo. Não se pode viver na prosperidade numa extremidade da terra, enquanto na outra extremidade existe degradação, doença, fome e esqualidez. Talvez a maioria de vós ignoreis isso, mas o deveis saber. Para se resolverem todos esses imensos problemas, perceber toda a estupidez do nacionalismo, dos conchavos políticos, das ambições, da avidez de poder, necessita-se do espírito cientifico. Mas, infelizmente, como se vê, o espírito cientifico está agora interessado em viagens à Lua ou mais além, em aumentar nossos confortos com geladeiras melhores, carros melhores, etc. Isto está certo, de modo geral, mas afigura-se-me um ponto de vista muito limitado.

Sabemos o que é "espírito cientifico": espírito de investigação, nunca satisfeito com seus achados, sempre variável, nunca estático. Foi o espírito cientifico que criou o mundo industrial; mas esse mundo industrial, sem revolução interior, produz uma medíocre maneira de viver. Sem essa revolução interior, todas as glórias e belezas da chamada vida intelectual só podem tornar a mente mais embotada, mais contentada, satisfeita, segura. O progresso em certos sentidos é essencial, mas também destrói a liberdade. Não sei se já notastes que, quanto mais coisas tendes, tanto menos sois livres. E, por isso, os homens religiosos do Oriente têm dito: "renunciemos às coisas materiais, pois não importam. Busquemos a outra coisa; mas eles não acharam também essa "outra coisa". Sabemos, pois, mais ou menos, o que é espírito científico — o espírito que existe no laboratório. Não me refiro ao cientista como indivíduo; este é provavelmente igual a vós e a mim, entediado da existência de cada dia, avarento, ávido de poder, posição, prestígio.

Agora, muito mais difícil é averiguar o que é espírito religioso. Como proceder, quando se deseja descobrir algo verdadeiro? Queremos saber o que é espírito religioso — não esse estranho espírito que prevalece nas religiões organizadas, porém o genuíno espírito religioso. Como proceder?

Só se começa a descobrir o que é o verdadeiro espírito religioso por meio do pensar negativo, porquanto, para mim, o pensar negativo é o pensamento em sua forma mais elevada. Entendo por pensamento negativo aquele que despreza, que rompe e destroça as coisas falsas construídas pelo homem para sua própria segurança, seu sossego interior; que destroça todas as defesas e o mecanismo de pensamento construtor dessas defesas. É preciso destroçar tudo isso, ultrapassá-lo, rapidamente, celeremente, para ver se algo existe além. E o ultrapassar dessas coisas falsas não é uma reação ao que existe. Certo, para descobrirmos o que é o espírito religioso e dele nos abeiramos negativamente, precisamos ver no que cremos, e porque cremos, porque aceitamos todos os inumeráveis condicionamentos que as religiões organizadas do mundo inteiro impõem à mente humana. Por que credes em Deus? Por que não credes em Deus? Por que tendes tantos dogmas e crenças?

Direis, porventura, que se ultrapassarmos todas essas chamadas estruturas positivas atrás das quais a mente se abriga, ultrapassá-las sem desejar encontrar algo mais — nada mais restará senão desespero. Só existe desespero quando há esperança — a esperança de nos pormos em segurança, permanentemente confortados, perpetuamente medíocres, perenemente felizes. Para a maioria de nós, o desespero é reação à esperança. Mas, para se descobrir o que é o espírito religioso, acho que essa investigação deve realizar-se sem nenhuma provocação, nenhuma reação. Se vossa busca é apenas uma reação — porque desejais mais segurança interior — nesse caso vossa busca visa apenas a um conforto maior, seja numa crença, numa ideia, seja no conhecimento, na experiência. E a mim me parece que tal modo de pensar nascido da reação só pode produzir mais reações, e, por conseguinte, não oferece a libertação do processo de reação que impede o descobrimento. Não sei se está claro o que estou dizendo.

Deve haver uma maneira negativa de proceder, e isso significa que a mente necessita tornar-se cônscia do condicionamento imposto pela sociedade, em relação à moralidade; cônscia das inumeráveis sansões impostas pela religião; e cônscia, também, de como, rejeitando essas imposições exteriores, cultivamos certas resistências internas, crenças conscientes e inconscientes, baseadas na experiência, no conhecimento, e que se tornam fatores diretores.

Assim, para descobrir o que é o verdadeiro espírito religioso, a mente deve achar-se num estado de revolução, e este significa a destruição de todas as coisas falsas que lhe foram impostas, seja por pressão externa, seja por ela própria; pois a mente está sempre em busca de segurança.

Afigura-se-me, pois, que o espírito religioso encerra esse constante estado mental que nunca constrói para sua segurança. Porque se a mente constrói com essa ânsia de segurança, então ela fica vivendo atrás de seus próprios muros e, portanto, é incapaz de descobrir algo novo.

Por conseguinte, a morte, a destruição do "velho", é necessária: destruição da tradição, libertação total do que foi, abandono das coisas acumuladas como memória através dos séculos. Então, direis, porventura: "Que mais resta? Tudo o que sou é constituído por todo esse conjunto de fatos, essa "história", a experiência; se tudo isso desaparece, se apaga, que resta? — Em primeiro lugar, pode-se apagar tudo isso? Podemos falar a esse respeito, mas é verdadeiramente possível apagá-lo? Eu digo que é possível — mas não por influência ou coerção, pois isso é insensatez, falta de madureza. É possível, se o penetrarmos profundamente, afastando de nós toda autoridade. E esse "limpar da lousa" — que significa morrer todos os dias e de momento em momento, para as coisas acumuladas — requer abundante energia e profundo discernimento; e isso faz parte do espírito religioso.

Outra parte do espírito religioso é o "espírito-força", que inclui a ternura e o amor. Estou tentando expressar-me por meio de palavras, mas tende a bondade de não vos contentardes com palavras, apenas. Eu disse que outra parte do espírito religioso é a força proveniente do amor. E com essa palavra "força" quero referir-me a algo completamente diferente do impulso para ser poderoso, do desejo de dominação, controle; do poder que a abstinência confere; ou do poder de uma mente sagaz, cheia de ambição, avidez, inveja, ávida de perfeição. Este poder é maligno. O domínio de uma pessoa sobre outra, o poder político, o poder de influenciar outros para pensarem de certa maneira, seja exercido pelos comunistas, pelas igrejas, seja pelos sacerdotes ou pela imprensa — este poder, para mim, é extremamente nocivo. Estou-me referindo a coisa muito diferente, tanto em grau como em qualidade, algo sem nenhuma relação com o poder dominador. Existe essa força, esse poder, uma coisa "exterior", não produzida por nossa vontade ou desejo. Nesse poder reside aquela coisa extraordinária que é o amor; e este faz parte do espírito religioso.

O amor não é sensual; nenhuma relação tem com a emoção; não é reação ao medo; não é amor materno, amor conjugal, etc.

Segui bem isso, por favor, penetrai-o, sem nada aceitar, nem rejeitar, pois estamos jornadeando juntos. Direis, talvez: "Um tal amor, um tal estado mental não baseado em lembrança, é impossível". Mas eu acho que ele pode ser encontrado. Encontramo-lo por vias obscuras, ao investigarmos no seu todo o processo do pensamento, as peculiaridades da mente. É um poder existente por si só; é energia não causada. Difere inteiramente da energia gerada pelo "eu" em sua ânsia de alcançar as coisas que deseja. E aquela energia existe, mas só será encontrada pela mente livre, não vinculada ao tempo e ao espaço. Nasce aquela energia quando o pensamento — como experiência, conhecimento, como "ego", centro — o "eu" — gerador de sua própria energia, volição e concomitantes pesares, aflições etc. — se dissolve. Dissipado esse centro, manifesta-se aquela energia, aquela força que é o amor.

(...) Assim, no sentido da palavra "religioso", é necessária uma revolução em cada um de nós — revolução total e não parcial. Toda reação é parcial; e a revolução a que nos referimos não é parcial e, sim, uma coisa total. E só essa mente pode ter intimidade com a Verdade. Só essa mente pode ter "amizade" com Deus — ou o nome que preferirdes. Só essa mente pode participar da Realidade.

Krishnamurti - 25 de maio de 1961

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill