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quinta-feira, 19 de abril de 2018

A verdade ou a compreensão vem num clarão

A verdade ou a compreensão vem num clarão

[...] PERGUNTA: A paixão, ou intensidade, é uma qualidade?

KRISHNAMURTI: Que será que entendemos pela palavra “qualidade”? A paixão, ou intensidade, é uma virtude adquirível pela prá tica, pela disciplina, pelo autossacrifício, etc.? É isso que entendeis?

OUTRO INTERROGANTE: Posso jazer uma pergunta?

KRISHNAMURTI: Senhor, já fizeram uma pergunta. Como vedes, tão ocupados nos achamos com os nossos próprios problemas que não prestamos atenção a ninguém mais; isso sempre acontece na vida. Tão envolvidos estamos em nossos problemas, nossas esperanças e ambições, nossos próprios desesperos, que quase nunca enxergamos nada além de nosso pequenino “eu”. Talvez outros aqui tenham outros problemas, mas sugiro, respeitosamente, que não vos ocupeis de tal maneira com a pergunta formulada.

Voltando à pergunta — A paixão ou intensidade é uma qualidade? — não gosto do emprego da palavra “qualidade”. Quando estais “apaixonado”, em relação a alguma coisa, não perguntais se isso é uma qualidade, perguntais? Vós vos achais naquele estado. Quando sentis cólera, ou lascívia, ou quando verbalmente tratais alguém com brutalidade, não perguntais nesse momento se o que sentis é uma “qualidade”. Estais todo em chamas. Mas, mais tarde, dizeis: “Por Deus, foi um momento terrível” — e isso se toma então algo que cumpre evitar no futuro. Ou, se foi um belo momento, tratais de cultivá-lo; mas tudo o que se cultiva é artificial, não é uma coisa pura.

Ora, a paixão, ou intensidade, a cujo respeito estive falando, não é cultivável, não se acha à venda no mercado, não se pode comprar com a prática ou a disciplina; mas, se escutastes e verdadeiramente penetrastes em vós mesmos, se vos empenhastes deveras em compreendê-la, sabereis o que ela é. Essa paixão nada tem em comum com o entusiasmo. Só desponta depois da completa cessação do “eu”, depois de abandonada a ideia de “minha casa”, “minhas posses”, “minha pátria”, “minha mulher”, “meus filhos”. Agora direis, talvez: “Então não vale a pena ter essa paixão”. Talvez para vós não valha a pena. Só vale quando, efetivamente, desejamos descobrir o que é o sofrimento, o que é a verdade, o que é Deus, qual o significado de toda esta terrível e confusa lida da existência. Se esta questão realmente vos concerne, então deveis examiná-la com paixão — e isso significa que não podeis estar vinculado à vossa família. Podeis ter vossa casa, vossa família, mas se psicologicamente lhes estais vinculado, nunca passareis além.

PERGUNTA: Temos todos a mesma capacidade de paixão?

KRISHNAMURTI: Eu não considero a paixão uma “capacidade”. Podeis ter aptidão para escrever livros, compor poesias, tocar flauta, ou para muitas outras coisas; e as aptidões podem ser cultivadas, mantidas, acrescentadas. Mas a paixão, a intensidade, não é uma aptidão. Pelo contrário, se tendes alguma capacidade, deveis morrer para ela, a fim de poderdes “apaixonar-vos”. Se não morreis para a capacidade, ela se torna mecânica, ainda que a aprimoreis e dela façais uso hábil. Vede, estamos ainda pensando em termos de aquisição, e cuidando de proteger o que adquirimos.

PERGUNTA: Dissestes que o sofrimento é uma coisa bela e, no entanto, dizeis que devemos livrar-nos do sofrimento.

KRISHNAMURTI: Eu nunca disse que devemos livrar-nos do sofrimento. O que eu sempre acentuei é que devemos olhar o sofrimento, penetrá-lo, compreendê-lo. Não podeis livrar-vos dele, não podeis “jogá-lo fora”. Quando é que sofremos? Se amais alguém e essa pessoa não corresponde ao vosso amor, sofreis. Por quê? Por que deveis sofrer? Que significa o vosso sofrer? Significa que estais pensando em vossa própria pessoa — eis o fato real. E enquanto só pensardes em vossa insignificante pessoa, desejando ser amado e temendo não ser amado — com todos os desagrados que isso implica — naturalmente tereis de ter isso a que chamais “sofrimento”. De modo idêntico, se desejo ser um homem famoso, e não o sou, sofro, inevitavelmente; e se me satisfaz permanecer nesse estado, então está certo. Mas, se desejo compreender meu sofrimento e transcendê-lo, começo então a olhá-lo; examino rigorosamente o impulso psicológico para ser famoso, o qual é extremamente superficial, imaturo! — e vem então uma compreensão do sofrimento, a qual é o começo de sua própria extinção. E, como disse, depois de transcender essa amargura, descubro que o amor, a aflição e a morte são a mesma coisa. Esse é um estado de grande beleza — beleza não formada pelo homem ou pela natureza.

PERGUNTA: A paixão, ou intensidade, é desejo de saber?

KRISHNAMURTI: Que se entende por “desejo de saber”? O impulso para acumular conhecimentos faz também parte do “vir a ser” e é, por conseguinte, uma causa de conflito. Mas eu não falo do acumular de conhecimentos que podem ser encontrados em qualquer enciclopédia. Eu quero compreender o sofrimento, penetrá-lo de ponta a ponta, para descobrir por mim mesmo o seu significado; e isso não significa que eu preciso saber. Saber, como anteriormente expliquei, é uma coisa, e algo diferente é o aprender. O saber implica acumulação de conhecimentos, e quando tendes conhecimentos acumulados, é com essa base que “experimentais”. Pela experiência adquiris mais saber ainda; mas, nesse mecanismo aquisitivo de acrescentar mais saber ao já obtido, não se acha o “movimento do aprender”. Só se pode aprender quando já não se busca nem se adquire saber.

Senhor, eu não desejo saber nada sobre o sofrimento. Todos padecemos. Não tendes sofrimento, numa ou noutra forma? E desejais saber o que é ele? Então, podeis analisá-lo e explicar porque sofreis. Podeis ler livros acerca do assunto, ou ir à igreja, e, assim, depressa sabereis algo a respeito do sofrimento. O saber não põe fim ao sofrer. Começamos a deixar de sofrer quando encaramos os fatos psicológicos ocorrentes em nosso interior e deles nos cientificamos de momento a momento, avaliando-lhes o total significado. Isso demonstra que não devemos fugir à realidade de que nos achamos em sofrimento, nunca devemos racionalizá-lo, nem propor uma opinião a seu respeito, mas, sim, ‘‘viver inteiramente com o fato”.

Como sabeis, o “vivermos com a beleza daquelas montanhas” e não nos acostumarmos com ela, é muito difícil. Em maioria, vos achais aqui já há cerca de três semanas. Tendes contemplado aquelas montanhas, ouvido o barulho do rio, visto as sombras estenderem-se através do vale, dia após dia; e não notastes como é fácil nos acostumarmos com tudo isso? Dizeis: “Sim, isto é realmente belo” — e passais adiante. “Viver com a beleza” ou “viver com uma coisa feia” e não se deixar acostumar com ela, isso requer imensa energia — um percebimento que não deixa a mente embotar-se. Da mesma maneira, o sofrimento embota a mente, se com ele nos acostumamos. Mas não há necessidade de nos acostumarmos com o penar. Podemos “viver com a amargura”, compreendê-la, penetrá-la — mas não com o fim de sabermos alguma coisa a seu respeito. Sabeis que o sofrimento está presente, que é um fato, e nada mais precisais saber. Cumpre “viver com o sofrimento” e, para viverdes com ele, deveis amá-lo; e, assim, descobrireis que, efetivamente, o amor, o sofrimento e a morte constituem uma só coisa.

PERGUNTA: Não existe amor sem paixão?

KRISHNAMURTI: Que entendeis pela palavra “paixão” e pela palavra “amor”? Não importa se sois homem ou se sois mulher, se sentis amor por outra pessoa, não tendes paixão, pelo menos durante os dois primeiros anos, ou outro período qualquer? Depois, vos acostumais um com o outro e começais a enfastiar-vos. Com aquela paixão, embora a chamemos amor, há luxúria, apego, ciúme, ambição, avidez, e tudo o mais. Ela é como uma chama em meio de densa fumarada. E que acontece? Gradualmente, morre essa chama, e só vos resta fumaça. Mas se desaparecer o apego, a luxúria, o ciúme, e todos os outros elementos que mantêm o conflito e a fumaça produzida por isso que chamamos “paixão” — se tudo isso desaparece, não por ação do tempo ou do hábito, mas, sim, porque nós o penetramos, o compreendemos, vimos-lhe as profundezas e alturas, então o amor pode ser paixão sem causa. Não me refiro à paixão do missionário que, com seu amor a Jesus, sai pelo mundo a converter os pagãos; não é esta a paixão a que aludo. Pelo contrário, a paixão de que falo é a negação de tudo isso, sem nenhum motivo. E dessa negação desponta aquela chama límpida e clara.

PERGUNTA: É possível a um ente humano achar-se em permanente estado de compreensão?

KRISHNAMURTI: Importa compreender o que se entende pela palavra “permanente”. Não acho que possais “achar-vos permanentemente” em coisa alguma. Se permaneceis em alguma coisa, estais morto. E isso é o que em maioria desejamos: queremos que certas coisas — o amor, a paixão, a compreensão, Deus — continuem perenemente. E isso significa o quê? Que não desejamos ser perturbados, que não desejamos ser sensíveis, estar vivos. Como já expliquei, a verdade ou a compreensão vem num clarão, e esse clarão não tem continuidade, não se acha na esfera do tempo. Vede isso por vós mesmo. A compreensão é nova, instantânea, não é a continuidade de algo que antes existiu. O que teve existência anterior não pode trazer-vos nenhuma compreensão. Enquanto buscamos uma continuidade — desejando a permanência nas relações, no amor, na ânsia de encontrar a paz duradoura, etc., etc., — estamos perseguindo uma coisa que se acha na esfera do tempo e que, por conseguinte, não pertence ao eterno.

Krishnamurti, Saanen, 5 de agosto de 1962,
O homem e seus desejos em conflito

quinta-feira, 12 de abril de 2018

A Verdade só pode ser percebida num clarão


A Verdade só pode ser percebida num clarão

[...] Nesta tarde, vou falar sobre a mente religiosa e a mente nova. E, para examinarmos este assunto — e desejo fazê-lo com certa profundeza — acho necessário compreendermos o significado das palavras.

Usamos as palavras para comunicação; mas, as palavras se tornam barreiras à comunicação quando aceitamos a acepção comum de uma palavra, e esta se torna o padrão de nosso pensar. Vou empregar a palavra “religioso” num sentido todo diferente. A mente tem capacidade para agir totalmente, não em fragmentos, não em partes. A mente que é capaz de ver, no “imediato”, no presente, o todo e não apenas a parte; a mente capaz de compreender, no agora “imediato”, a totalidade da existência — essa mente encerra, em essência, a beleza e a lucidez do amor, o único que pode unir a ação ao Todo. E é necessário compreender essa qualidade da mente religiosa, cuja ação não é dividida, fracionada, fragmentada, porém total. Em si, essa mente é livre da “ideação” como memória, como efeito do “eu”. É o “eu” que fraciona a ação; é o “eu” que impele à aquisição. Esse impulso de apego jamais compreenderá a ação total, própria da mente religiosa.

Assim, estou empregando a expressão “mente religiosa” para designar um estado de ação que une todas as diferentes ações da vida. Essa mente não se acha dividida em “mundo” e “não mundo”, “exterior” e “interior”. Não há “mundo exterior” e “mundo interior”, Há só um movimento, ora externo, ora interno, qual o da maré, que “sai” e torna a “entrar”. A mente religiosa tem a faculdade de compreender o exterior e, com essa compreensão do exterior, passar, natural e facilmente, ao interior, sem dividir o mundo em “exterior” e “interior”.

Mas, para se compreender a totalidade da mente religiosa, é preciso começar a investigar os vários e complexos problemas do viver. Nosso viver diário é extremamente confuso; é um viver de conflito, da aflições inúmeras, de contradições, luta perene; assim é nossa vida. E é só essa a vida que conhecemos. Nenhuma ação conhecemos que não seja reação. Essa reação é que gera sofrimento; e, em virtude desse sofrimento, mais se acentua a divisão em “exterior” é “interior”, “ilusão” e “realidade”. Só há um mundo, e não “mundo exterior” e “mundo interior”. E, se não compreendeis a ação total da mente religiosa, por mais que vos esforceis, por mais revoluções que façais — econômicas, sociais, de qualquer espécie — por mais que planejeis, a prosperidade daí resultante se tornará apenas um meio de destruir a liberdade; e, embora nos seja necessária, a prosperidade se torna então um meio de segurança psicológica. E a mente que, no sentido psicológico, se acha em segurança, não é uma mente religiosa.

Assim, para podermos investigar a natureza da mente religiosa — aquele estado em que a mente é livre do conflito do “eu” — devemos examinar a questão da simplicidade, descobrir o que é “ser simples”; não a ideia da simplicidade, o ideal da simplicidade, não o símbolo da simplicidade, porém o verdadeiro estado da mente na realidade simples. Com a palavra “simples” quero significar: enfrentar cada fato da vida de cada dia e de cada minuto sem nenhuma complexidade; olhar os fatos sem o complexo mecanismo do pensamento; olhar os fatos sem “ideação”, sem ideal. Essa simplicidade não está meramente no modo de trajar, no andar de tanga, no tomar uma só refeição diária; no usar longas barbas ou a cara toda rapada. Refiro-me à simplicidade que tem precisão no pensar, que nenhum conflito tem, nenhuma ilusão, nenhum futuro, que encara o fato, só o fato, nada mais senão o fato.

Essa mentalidade, essa atitude, perante a vida, traz consigo um sentimento de inefável deleite. Poucos de nós somos felizes, natural, fácil e espontaneamente felizes; tão complexos somos, tão numerosos são os nossos problemas! Tudo o que tocamos com a mão, ou com a mente, se torna feio. E quando qualquer coisa se torna seca, vulgar, não há mais sensibilidade; por conseguinte, não há apreciação das coisas como são. Só no apreciar as coisas como são, no enfrentá-las em sua realidade, só daí, dessa compreensão, pode vir a verdadeira revolução.

Essa revolução não se opera consoante o padrão estabelecido por outrem — pelo economista, pelo reformador, pelo político. A revolução a que me refiro só nasce quando sois capaz de ver o fato e de agir de momento a momento em conformidade com esse fato. Assim, vereis que, dessa simplicidade, não só vem um extraordinário sentimento de desafogo, de alívio, mas também profundo deleite. E, sem essa alegria, sem essa centelha, sem essa canção no coração, a vida se torna extremamente vazia. Podeis ser muito talentoso, possuir muitas casas, ocupar posições importantes, influenciar milhares de pessoas por meio da imprensa; mas, atrás dessa fachada de palavras, aposição, prestígio, tudo é vazio, oco.

E é relevante, para o indivíduo, para cada um de nós, possuir esse sentimento de infinita alegria. Ele vem, não por terdes um bom emprego, por terdes feito um casamento feliz ou infeliz; vem sem nenhuma razão. E essa alegria existe; mas só podeis encontrá-la “no escuro”, sem o saberdes, ao compreenderdes a simplicidade da virtude. À virtude não é uma coisa para se alcançar mediante esforço — porque, então, deixa de ser virtude. Quando um homem vaidoso “pratica” a humildade, essa humildade é a própria essência da vaidade. Mas, a virtude é ordem: ordem na mente. E não podeis ter ordem se essa ordem é apenas um padrão sancionado pela sociedade, se é uma mera prática, um hábito; a mente se torna, então, embotada. E uma mente embotada não é virtuosa; poderá ter hábitos excelentes, nunca irritar-se, mostrar-se “virtuosa” e observar os preceitos da sociedade; mas, essa mente não é sensível e, por conseguinte, não é uma mente virtuosa.

Tende a bondade de prestar atenção; mas isso não significa que, fazendo-o, vos tornareis repentinamente virtuosos. Sereis virtuosos, de repente, no mesmo instante, se não estais seguindo o padrão de uma sociedade feia e corrupta; desse modo, tereis ordem e espaço mental. Essa ordem traz eficiência. A mente eficaz no pensar, isenta de conflito, essa é que é a mente virtuosa, a mente que vive com virtuosidade. Quando a virtude é resultado de conflito, resultado de constante luta, ou seja da batalha dos “opostos”, a mente não só se torna insensível, mas é também incapaz de voo célere. Só a mente eficiente tem presteza para ver as coisas num clarão. Porque a verdade só pode ser percebida num clarão; a verdade não tem continuidade. O que tem continuidade pertence ao tempo; e o que é do tempo não tem espaço. Pois só a mente que tem espaço pode ver, num clarão, o que é verdadeiro. Só a mente virtuosa tem espaço; por conseguinte, somente ela pode, num clarão, ver a Imensidade, o Eterno. A virtude não é produto da memória. Se a virtude é produto da memória é, então, uma reação à memória; “reação” é reflexo da memória. A virtude reconhecida pela sociedade, pelas ordens religiosas, por grupos, gera conflito; sendo assim, a mente não é simples.

Como sabeis, o mundo se está tornando cada vez mais complexo. Vossas atuais relações se estão tornando cada vez mais complexas, e não mais simples. A complexidade da vida só pode ser compreendida quando a considerais de maneira simples, bem simples. A vida não é apenas vossa existência diária — ir para o emprego, discutir com a esposa ou o marido, os aborrecimentos, as angústias, o conflito da existência de cada dia. A vida inclui não só o passado, que se projeta no futuro, mas também morte, felicidade, e algo que se acha além do tempo, além do pensamento, do sentimento. E é preciso compreender essa imensa totalidade da vida — não só o “cantinho” de vossa existência, a pequena porção de terra que chamais vossa pátria, o pequeno templo construído pela mão, e sem nenhum significado. A vida é uma coisa extraordinária, uma coisa total, na qual tudo está contido. E, se não compreenderdes a imensidade da vida, que tudo abarca — cada grito, cada lágrima, cada canção de ave, as angústias e sofrimentos e agitações da existência — se não compreenderdes essa totalidade, nunca tereis um clarão daquela imensidade.

Para compreenderdes esta coisa extraordinária que se chama a vida — com suas necessidades sexuais, suas ambições, impulsos, frustrações, velhice, declínio, deterioração — deveis considerá-la de maneira bem simples. E aí é que está a nossa dificuldade; porque somos entes humanos tão complexos e tantas ideias temos. Somos muito talentosos, mas somos entes “de segunda mão”; não há nada original em nós; e é a originalidade que leva à simplicidade, e não a excentricidade, a capacidade de inventar. Mas, essa simplicidade é a simplicidade da mente que compreendeu todas ás facetas da vida — não a vida técnica, a vida de conhecimentos acumulados, porque o saber e o conhecimento técnico podem expandir-se indefinidamente. Sabereis mais e cada vez mais a respeito das coisas, a respeito de Vênus, a respeito da Lua; mas sabereis cada vez menos sobre vós, sobre o que sois. O que sois é a totalidade da vida. Porque sois entes lastimáveis, infelizes, por causa das angústias, do “sentimento de culpa”, e das agonias que sofreis, em silêncio ou abertamente, porque sois assim, para compreenderdes a vida, deveis primeiramente compreender a vós mesmos.

Podeis compreender a vós mesmo, que sois uma entidade complexa, observando-vos com toda a simplicidade. E, com essa percepção, esse ver, esse escutar, compreendereis. Deveis escutar a vós mesmo, não a vosso “Eu Superior” — não há nenhum “eu superior”, nenhum Atman; isso é invenção da mente, resultado do pensamento, do pensamento que é reação da mente, das coisas que foram. Assim, quando vos olhais cada dia, em cada palavra que pronunciais, quando buscais o caminho para as profundezas de vosso coração, então, desse olhar, desse ver, desse escutar e ouvir, vem a simplicidade. Se dessa simplicidade vem alegria; e isso é virtude.

A mente religiosa não tem realmente nenhuma experiência. Importa compreender isso, porquanto todos desejamos experiências e mais experiências. E toda experiência, como assinalei outro dia, é “resposta” a um “desafio”, de acordo com vosso fundo, vosso condicionamento; por conseguinte, cada experiência fortalece aquele condicionamento, e não liberta a mente. Mas vós deveis compreender a natureza de vosso próprio pensamento, a maneira como agis, a maneira como olhais o rosto do motorista de ônibus. Alguma vez olhaste para o motorista do ônibus? Alguma vez olhastes para o seu rosto? Observai-o, uma vez ou outra, ao irdes para o escritório. Vede como é macilento, como parece cansado, esgotado! Percorrer o mesmo caminho, “para cima e para baixo”, todo o santo dia, mês após mês — nisso não há alegria, não há nada senão hábito mecânico e, em tais condições, nunca pode um homem observar as coisas que o rodeiam. Isso indica, por certo, uma mente que se tornou calejada, embotada. Entretanto, essa pessoa fala a respeito de Deus, da Verdade, do desejo de compreender, mas não está apercebida das coisas existentes em redor de si, de sua maneira de se vestir, sua maneira de falar, sua maneira de olhar os indivíduos importantes e os não importantes. Se não conhecerdes tudo isso, se não lançardes a base para tudo isso, não podereis ir muito longe. E virtude é o percebimento do presente.

Vede, estamos sempre vivendo no passado e no futuro. Principalmente quando vos tornais mais velho, o passado assume extraordinária significação, e o futuro é o que chamais “morte”. Por essa razão, volveis ao passado e evitais o futuro; pensais na pretérita felicidade, na ditosa juventude ou na lamentável existência que levastes. Vivemos, assim, entre o passado e o futuro. Se ainda sois jovem, tendes ainda o futuro para dele fazerdes alguma coisa, e o moldais conforme o passado. Estais, pois, aprisionado entre o passado e o futuro. Observai vossa própria mente, vossa própria vida. Não vos limiteis a ouvir o que estou dizendo, mas observai efetivamente a vossa existência. Vereis como está dividida entre o passado e o futuro; e, se não está, isso significa que viveis meramente no “imediato”, no dia a dia, e procurando tirar daí o melhor proveito possível. Porque pode vir uma guerra, pode vir uma revolução política, uma revolução econômica, uma comoção social; qualquer coisa pode acontecer amanhã; o amanhã é incerto. Por conseguinte, se não viveis entre o passado e o futuro, viveis apenas para hoje. Há muitos que vivem para hoje e que chamam a si próprios por diversos nomes. E quando, consciente ou inconscientemente, procurais tirar de hoje o melhor proveito possível, estais fadado ao desespero.

Escutai o que estou dizendo. Achais-vos em desespero se viveis no passado ou no futuro; estais também em desespero, se estais vivendo unicamente para hoje — como está fazendo a maioria das pessoas; esse é o mundo político. Este pobre país está sob o controle dos políticos; e os políticos só têm interesse no “imediato”. Esse imediato pode ser prolongado por certo tempo, mas suas fontes estão ainda no “imediato”. A maioria das pessoas deseja ser feliz imediatamente, deseja êxito imediato. Quando só nos interessa o “imediato”, todas as manifestações de nossa existência são em termos do imediato. Forcejando pelo “imediato”, encontrareis, inevitavelmente, infinito desespero; e, por causa desse desespero, inventais filosofias, e o transformais em virtude. E quanto mais intelectuais, quando mais instruí­dos e ilustrados fordes, tanto mais superficial se tornará o “imediato”. Assim, quer vivais no passado, quer no futuro, quer vivais apenas para hoje, todos estais aprisionados numa vida de aflição, de agitação, numa vida extremamente superficial. Por “superficial” não estou entendendo “alimentação, roupa e morada”, pois necessitamos dessas coisas; refiro-me à superficialidade psicológica da existência.

Porém, se compreendeis o tempo passado, o tempo presente e o tempo futuro — causadores de sofrimentos e desespero, de ansiedade e “culpa” — não a pouco e pouco, nem examinando ou analisando o passado, mas vendo a coisa como um todo, podeis, então, ver a totalidade do tempo, que estava dividido em passado, futuro e o agora. Se virdes isso, se o compreenderdes realmente, dessa maneira, como coisa total, vereis que com essa compreensão, a mente se torna livre do passado, do presente e do futuro. E a mente deve ser livre. É dessa liberdade que nasce o indivíduo.

É de imensa importância que sejais um indivíduo, porquanto os governos, a educação, a sociedade e a religião vos estão obrigando a ajustar-vos, estão fazendo de vós uma “máquina de crer” ou de “não crer”. Sempre pensamos em revolução em termos de comoção econômica, social ou estrutural. Mas toda reviravolta é um reflexo do passado e, por conseguinte, institui um padrão semelhante (ao do passado), porém com “outros homens”, com outro sistema de ideias; mas, é sempre o mesmo padrão. Nós estamos falando de uma mente religiosa que compreendeu sua própria e total estrutura, seu próprio estado e, por conseguinte, é capaz de negar. Vós deveis negar; deveis ser indivíduos que dizem “não”, nunca “sim”. Sabeis quanto é difícil dizer “não” — não só a vossa esposa ou vosso marido, pois isso é relativamente fácil; mas dizer “não” à sociedade, dizer “não” a vossa ambição, dizer “não” a vossos temores, dizer “não” à autoridade. Quando dizeis “não”, entendeis “não” — terminantemente “não”! Se disserdes “não”, descobrireis como isso é extraordinariamente complexo.

Mas, dizendo “não”, descobrireis tudo a respeito de vós mesmo, o de que sois feito, como funciona vosso pensamento, os profundos recessos, o profundo e nunca “frequentado” espaço existente em vossa mente, o qual nunca examinastes. Só quando descobris a vós mesmo, podeis “emergir” da sociedade, tornar-vos um indivíduo. Ao dizerdes “não” vereis que daí nasce energia. Vós necessitais de energia. Tendes energia para ir ao escritório todos os dias; achais isso absurdo, mas ides. Quando exerceis vossas ocupações, quando falais, quando viajais de ônibus ou em vosso próprio carro — isso é uma forma de energia. A vida é energia. Cada pensamento, cada sentimento é uma forma de energia. Mas a energia que nós mesmos geramos e cultivamos nasce da resistência — do resistir, contraditar, aquiescer, imitar. Pela resistência, pela repressão, tendes energia; é só essa a energia que conhecemos; se vos empurro, empurrais também, resistindo. Mas essa energia é completamente diferente da energia de que estamos falando.

A energia a que nos referimos não promana de resistência. Resistência implica sempre motivo, ou seja, medo, solidão, sentimento de culpa ou alguma forma de apego, etc. Por favor, examinai vossa própria mente, e vosso coração, e vereis. Vós tendes energia gerada por algum motivo; por conseguinte, essa energia encontra resistência e começa, assim, a batalha em nossa vida. Essa é a única forma de energia que conhecemos. As pessoas chamadas religiosas, aquelas que estão perenemente em busca de Deus, sem nunca encontrarem Deus, cultivam a energia pela negação com motivo; pensam que nascerá energia se se tornarem celibatárias, se negarem a vida, o processo natural da vida, retirando-se para um mosteiro e praticando “boas obras”, pelo controle de si mesmas. Isso, efetivamente, dá energia; mas essa energia nasce da resistência, nasce do conflito, nasce da repressão. A repressão gera extraordinária energia, tal como o vapor sob pressão; mas essa repressão se torna “religiosa”, e fica associada a Jesus, Krishna ou outro. Entretanto, interiormente, essa energia gera infinita aflição.

Se escutardes o que estou dizendo, vereis como é produzida a vossa energia. Quando descobris, desvendais os vossos motivos e deles vos livrais, e, então, dessa liberdade, provém uma energia de espécie diferente. Essa energia nasce sem motivo, porque ela é a verdadeira essência de uma mente de todo vazia — mas não “em branco”. A mente vazia não tem resistência; porque todo pensamento é resistência. É essa a energia que deveis ter, e não a energia produzida por motivo, conflito, contradição, tensão. Porque essa energia, como podeis ver, traz inaudita aflição, sofrimento. Assim é a vida, vossa existência diária. Vós tendes de compreender isso, mas sem tentar achar aquela energia não motivada, pois não podeis achá-la. Deveis ser livre de resistência. E só podeis ser livre de resistência ao serdes capaz de olhar a vida de maneira simples, olhar a vós mesmo sem nenhuma ideia, nenhum conceito, nenhuma fórmula, nenhuma comparação: olhar, simplesmente. Daí surgirá — como vereis, se alcançardes este ponto — a mente livre, que não é resultado de nenhuma busca.

Como sabeis, todos vivemos buscando — cada um de nós. Buscamos a verdade, a felicidade, a finalidade da vida. Que implica esse buscar? Só podeis procurar algo que perdestes ou algo que já conheceis; desejais achá-lo. Quando dizeis que estais em busca da Verdade, isso é puro contrassenso. Se dizeis tal coisa, já deveis ter provado o sabor da verdade, ter compreendido o que é a verdade. E, se estais a buscá-la, deveis então tê-la perdido; mas a verdade não é coisa que se possa perder, e não é possível encontrá-la por meio de busca. Toda busca deve cessar completamente. Esta é a beleza da verdade. No momento em que começais a buscar, vede-vos em conflito; no momento em que começais a buscar, pondes em ação a energia da fuga — fuga ao fato, fuga ao que sois.

Assim, a mente que busca nunca achará, porque aquela Imensidade não é reconhecível. O que podeis reconhecer é coisa já conhecida — reconheceis vossa mulher, vossos filhos, vossa cidade, porque já os conheceis. Mas o que já sabeis a respeito da verdade não é a verdade. A verdade está além do tempo. Toda busca supõe distância — disto até aquilo. Assim se gera o tempo. A mente que busca a verdade nunca a achará. Escutai, por favor! Procurai compreender isto de uma vez por todas! Se o fizerdes, nunca mais procurareis a verdade.

Quando vos pondes a buscar, a busca se torna um problema. Não deveis ter problemas na vida, não deveis ter um único problema, nem sequer o problema de Deus, ou o problema da verdade, ou o problema da felicidade. Não deveis ter problema nenhum, porque todo problema implica luta, conflito. E a mente em conflito nunca será capaz de compreender o que é a verdade. Tratai de resolver o problema pela compreensão daquilo que o problema implica, da raiz do problema. Não tenteis resolvê-lo, não tenteis analisá-lo, não tenteis dar-lhe solução. Mas estudai-o, penetrai-o, e olhai-o, com todo o vosso ser. A mente que tem problemas nunca será capaz de compreensão e, por conseguinte, nunca será livre. Não vou mostrar-vos como evitar os problemas, porque cada dia é um problema. Mas, se estais atento, verdadeiramente atento, em cada minuto, nada se tornará um problema. Há uma constante observação, uma constante atenção, que é a “resposta”, não da memória, mas de algo muito mais significativo, muito mais amplo e profundo.

A mente religiosa, pois, não é uma mente que busca. A mente religiosa está livre de todos os problemas e, por conseguinte, pode enfrentar os problemas livremente, nunca oferecendo solo propício a um problema, para arraigar-se na mente. Tudo isso poderá parecer dificílimo. Mas vossa vida é difícil. É dificílima a vida que levais: o incessante ir e vir, o morrer, o viver dia por dia, sem nenhuma certeza, nenhuma segurança, em desespero. É dificílima a vida que levais.

Mas, há uma vida que não é difícil, em absoluto. É isto mesmo que quero dizer: essa vida não é difícil, absolutamente, ó que tendes de fazer é só prestar atenção, prestar atenção ao que estais fazendo. A atenção é virtude, a atenção é ordem, a atenção dá eficiência. Podeis ser cozinheiro, ou burocrata, ou funcionário do governo, isto ou aquilo; quando prestais atenção, completamente, com todo o vosso ser, há virtude. Virtude não é essa coisa insípida que a sociedade vos estimula a cultivar.

Como disse, para a mente religiosa é o amor que integra toda ação. Porque vê cada verdade, momento por momento, a mente religiosa possui aquela qualidade de amor que integra a ação. Não sei se alguma vez já amastes alguém, se amastes com todo o vosso ser, com vosso coração, vossa mente, vosso corpo, vosso pensamento, vosso sentimento, com tudo o que tendes. Se já amastes tão completa e totalmente, sabereis, então, em virtude desse estado, que em cada ação — qualquer que ela seja, nenhum conflito há, nenhum problema. Cada ação é integral, não provém de ideia alguma, não se adapta a nenhum princípio vosso. Porque só a mente religiosa compreende a totalidade da existência, que tão terrivelmente temos fracionado. Só a mente religiosa possui essa qualidade de amor e, por conseguinte, pode viver neste mundo.

E o amor é que é capaz de destruição. Vós deveis destruir — destruir a sociedade; mas isso não significa destruir edifícios, jogar bombas sobre governantes e políticos; estes têm seu próprio destino: deixai-os nas mãos dele. Mas a destruição, a destruição psicológica de tudo o que a sociedade fez de vós, essa é necessária. E só podeis destruir completamente quando existe a qualidade da compaixão. Só se torna existente a compaixão com a total compreensão da vida. Sem essa compreensão, podeis ser muito atenciosos, muito bondosos, muito delicados; mas, delicadeza, gentileza, bondade, não é amor; faz parte do amor, mas não é o amor. Não tem amor a mente que não é atenta, que não olha para si mesma e para o meio em que vive. O amor não é uma palavra, porém um estado real. Se não há amor, não podeis destruir; só podeis tornar-vos um reformador.

O amor e a destruição estão sempre unidos, e essa união é criação. Estas três coisas — criação, findar ou morrer, e amor — estão sempre unidas, são inseparáveis. Essa criação — que não significa pintar quadros ou gerar filhos — é energia sem motivo. Essa morte está fora do tempo. E com ela vem o amor. — Só então se pode ver o que existe além do tempo, além de todo o pensamento. Só então é a mente capaz de ver, “num relâmpago”, aquilo a que se não pode dar nome. E há, então, o Eterno que não é invenção da mente, invenção do Gita, da Bíblia. Tendes de pôr de parte todos os livros, todas as ideias, todos os ideais, todas as tradições; ficar completamente nu, vazio, sozinho. Só então se pode ver aquela Realidade.

Krishnamurti, Bombaim, 13 de março de 1962, A mutação Interior

segunda-feira, 20 de junho de 2016

A Verdade oferece a Verdade e não consolos

UMA vez mais, que confortadores são os vários consolos que se referem à morte e à sua angústia implícita! O céu – não por completo sem inferno -, a reencarnação, o espiritismo: poder-se acreditar seja em que teoria for que mais nos conforte.

Não existe lugar para nenhuma destas ilusões confortadoras nos ensinos de Krishnamurti. Ele fala de uma coisa única, de uma só – a busca da Verdade; e a “Verdade não oferece consolos”. Assim, pois, o primeiro passo ao longo deste caminho é o nos despojarmos das ilusões.

É o que Krishnamurti nos propele a fazer em todas as suas palestras; pois que mais do que isso significa a análise critica de nossos pensamentos, emoções e ações? E não é fácil, especialmente a uma geração por tal maneira envolta em ilusões como a nossa o tem sido, o tornar-se rude ao rasgar os envoltórios da alma. Produz feridas o abandonar crenças que nos tem suavizado e confortado, mesmo que se haja reconhecido sua vacuidade.

É duro como nada mais o é, estar-se internamente ativo e externamente ocioso, quando toda a nossa vida temos estado a fazer o inverso do que devêramos.

Quando se fica nu, tiritando em um cimo árido da montanha, é difícil não olhar por vezes para trás, para os vales verdejantes e macios que estão lá em baixo. É em momentos tais que volvemos sobre Krishnamurti a nossa ânsia quase desesperada para que ele reconheça as nossas dificuldades e resolva pelo menos um de nossos problemas de maneira a que nos proporcione paz. E sua resposta é: “A Verdade não traz consolos e eu falo somente da Verdade”.

Vem-me à memória um símile que pode servir para mostrar a situação tal como a vejo: quando outro dia o Professor Picard e seu companheiro subiram dez milhas em balão, passaram para além das nuvens, para o claro espaço azul.

Se então os houvessem inquirido acerca dos problemas que nos preocupam do lado de cá das nuvens, que resposta útil nos poderiam eles dar? Para eles, então nada mais existia que o céu azul sem nuvens.

Assim, pois, quando vamos a Krishnamurti e lhe perguntamos como poderemos solver nossos problemas humanos, como havemos de defrontar-nos com o amor e o ódio, com a fome e a saciedade, com a morte e o além, responde-nos ele: “realizai a Verdade, libertando-vos da consciência-do-ego e verificareis que todos esses problemas terão cessado de existir”.

Podemos viajar a qualquer distância sobre o solo, em sentido horizontal e continuaremos a estar ainda na região do sol e da sombra, alternando-se, na região das nuvens e dos céus límpidos. Se, porém, mudarmos nossa direção e passarmos através as nuvens, verticalmente, chegaremos ao azul eterno do espaço.

Krishnamurti não nega a existência de nossos problemas, nega, porém, o valor das soluções por nós propostas, pois que elas apenas perpetuam a causa que conduz a todo o sofrimento.

Muitas pessoas hão sido perturbadas e se têm sentido angustiadas pelo repúdio aparente de Krishnamurti no que se refere ao fato da reencarnação, e ainda pelos seus últimos enunciados a respeito.

Em parte alguma disse ele que a reencarnação é coisa que não exista, porém insiste em afirmar que a reencarnação nada mais sendo que o prolongamento do ego através do tempo, não pode, de forma alguma, curar-nos das tristezas que se originam da existência dessa individualidade separada a que denominamos ego. Continuidade alguma através do tempo e do espaço pode conduzir o homem a essa Verdade que é integridade (completeness) para além do tempo e do espaço.

Portanto, o conforto que desejamos encontrar mediante a ideia da reencarnação é puramente ilusório.

Krishnamurti nos diz que “tudo isto é tão simples” – e como tal deve apresentar-se ao homem que encontrou a Verdade. Não pode, porém, ser tão simples ou fácil, para o homem que se encontra emaranhado nas complexidades, o libertar-se de tais embaraços. Uma geração que tem sido encaminhada pela autoridade, consolada pelas ilusões, tecida pelos temores, não acha simples ou fácil permanecer solitária sobre um cimo de montanha fazendo face aos ilimitados espaços da Verdade, isolada e intrépida.

À medida que pusermos à prova nossa força, nossos temores se desvanecerão e nossa coragem surgirá e abençoaremos, então, a mão que nos desemaranhou das ilusões, mesmo que o processo haja sido penoso.

À medida que os nossos temores se esvaecem, nosso anseio pelo conforto desaparecerá também. Se quisermos consolos, eles abundam nas várias religiões e filosofias do mundo; se pretendermos a Verdade, lancemos fora o anseio de conforto, pois que “a Verdade não oferece consolos”

Mary Lutiens

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Encontrei a verdade, Deus, ou que lhe quiserem chamar

Pergunta: Segue Maomé, ou Cristo?

Krishnamurti: Posso perguntar porque é que alguém deve seguir outro? Afinal, a verdade ou Deus não se encontra imitando outro: nessa altura tornar-nos-emos apenas máquinas. Precisamos de fato, nós, como seres humanos, de pertencer a qualquer seita, seja o Maometismo, o Cristianismo, o Hinduísmo ou o Budismo? Se instituírem uma pessoa como vosso Salvador, como vosso guia, então tem que haver exploração; tem que haver uma modelação do mundo a uma determinada seita tacanha. Ao passo que, se realmente não instituirmos ninguém como autoridade, mas descobrirmos o que eles dizem, o que qualquer ser humano diz, então compreenderemos algo que é duradouro; mas apenas seguir outro não nos levará a lado nenhum. Presumo que sejam todos Cristãos, e que dizem que seguem Cristo. Seguem-no? Os seres humanos, quer pertençam ao Cristianismo ou ao Maometismo ou ao Budismo, seguem realmente os seus líderes? É impossível. Não o fazem. Portanto porquê chamarem a si próprios nomes diferentes e separarem-se? Ao passo que, se tivéssemos realmente alterado o meio em que nos tornamos assim escravos, nessa altura seríamos realmente Deuses em nós mesmos, não seguiríamos ninguém. Pessoalmente, não pertenço a nenhuma seita, grande ou pequena. Encontrei a verdade, Deus, ou que lhe quiserem chamar, mas não a posso transmitir a outro. Apenas se pode descobrir através da inteligência consumada, e não através da imitação de certos princípios, crenças ou personagens.

Jiddu Krishnamurti em Auckland, Nova Zelândia, palestra a homens de negócios 6 de abril, 1934.

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Só a Verdade pode nos libertar dos problemas

[...] Queremos ser amados, e, também, amar; desejamos possuir a capacidade de descobrir e compreender a Verdade — a Verdade não ouvida da boca de outrem, não achada num determinado livro. Queremos conhecer a Verdade, experimentar a Verdade diretamente, sem interpretação. 

Temos problemas incontáveis; o dia inteiro é cheio de problemas — que espécie de ação empreender, que profissão adotar, o desejo de preenchimento e ( por falta de compreensão dele) a cadeia sem fim de frustração. A fim de resolver estes problemas, apelamos em geral para alguém, para um livro, um sistema, um líder, um guru, ou para nossa experiência pessoal. Entretanto, se observarmos atentamente, o nosso desejo de achar uma solução por intermédio de alguém, de um guru, de um livro, de uma panaceia política, de um guia, verá que ele só nos leva à frustração. Não é isso o que acontece, na vida de quase todos nós?

[...] Vocês possuem livros religiosos, possuem guias e filósofos, observam numerosos rituais e, todavia, sempre estão acompanhados do temor, da frustração, da desesperança, da amargura, da ansiedade. Tal é o fado de todos nós!

E à medida em que vamos envelhecendo, com uma carga cada vez maior de experiências e desenganos, vemos que estamos perdendo a coisa mais essencial da nossa vida: a fé, não é exato? Entendo por "fé", não a mesma coisa que vocês estão acostumados a entender — a fé no líder, a fé no guru, e na experiência pessoal. Vocês podem não acreditar em coisa alguma, e fazem muito bem; porque, se não acreditam em nada, possuem uma possibilidade de descobrimento. Entretanto, o viver sem fé leva ao cinismo, ao ceticismo, a uma vida de gozos superficiais, e superficial beneficência. Se não nos tornamos cínicos, nos tornamos pessoas muito ativas e prestativas; mas aquela chama tão essencial ao pensar criador, é negada, sufocada. Creio ser essa coisa, essa chama, que nos cumpre encontrar, e não a solução para um problema qualquer, pois as soluções dos problemas são relativamente fáceis. 

Se são inteligentes, se possuem capacidade e energia, lhes é então relativamente simples estudar o problema. O estudo perfeito do problema representa, justamente, a sua solução, porquanto a solução não se acha fora do problema. Porém, para se estudar o problema, descobrir a verdade que ele encerra, para isso, necessita-se energia, vitalidade; e essa vitalidade, essa energia, são destruídas quando seguem alguém, quando obedecem ao guru, ao guia político, ou a um sistema econômico. Toda energia criadora de vocês se dissipou no seguirem alguma coisa, no disciplinarem suas mentes de acordo com um determinado padrão de ação. Se falha ou se morre o guia de vocês, se veem sós. 

Ora, é possível termos aquela fé criadora — se posso usar tal expressão — sem a identificarmos com um determinado padrão de pensamento? Não me refiro aqui à fé num guru, num livro, na experiência pessoal, mas àquela fé, àquela confiança que nasce do direto experimentar, por nós mesmos — prescindindo de tradições e mentores, compreendendo o problema diretamente, nos aplicando a ele com energia, com aquela extraordinária confiança, aquela capacidade de lhe descobrir a verdade intrínseca. Essa fé, sem dúvida é a verdadeira solução. Porque, sem ela, não somos entes humanos criadores. O que se faz necessário no mundo, hoje em dia, não são líderes, nem sistemas, nem gurus, mas, sim, a capacidade, por parte de cada indivíduo, para descobrir por si mesmo o que é a Verdade. 

A Verdade não é coisa de vocês ou  minha. A Verdade não é pessoal. É algo que surge quando a mente se acha muito lúcida, simples, direta, silenciosa. Só então surge a Verdade. Não podemos perseguir a Verdade. Tentamos persegui-la quando estamos dominados pela ânsia de solução para determinado problema. 

O que se necessita, pois, é a confiança, a fé imprescindível para o descobrimento da Verdade. Não podemos descobrir o que é a Verdade, se nossas mentes estão condicionadas. Infelizmente, a janela pela qual observamos a vida, está condicionada. Estamos condicionados como hinduístas, muçulmanos, cristãos ou budistas — isto é, estamos condicionados para pensar de uma determinada maneira. A conduta, o padrão de ação nos é inculcado desde a infância. E, por conseguinte, quando crescemos e começamos a experimentar, o fazemos através dessa cortina de condicionamentos; esta é uma óbvia consequência psicológica, quer nos agrade, quer não. 

Nunca somos livres para descobrir. Até agora abrigamos uma determinada forma de condicionamento — capitalista, ou socialista. Dizemos agora: "esta forma é insensata; nos tornemos comunistas". Se tornar comunista também é condicionamento. Por meio de um condicionamento, se pode resolver algum problema? Ao contrário, só se pode resolver um problema quando somos livres para meditar nele a fundo e experimentá-lo diretamente. E visto que estamos tão condicionados — religiosa, econômica, climaticamente, enfim, de todos os modos — não somos livres para olhar, observar, descobrir. Estamos agrilhoados, principalmente neste país; somos incapazes de pensar independentemente, livremente, por nós mesmos, sem ajuda dos guias, dos livros, dos líderes.[...] Tão inutilizadas estão as nossas mentes pela imitação, que somos incapazes de abandonar todos os livros e todos os guias, para refletirmos por nós mesmos sobre cada problema e descobrirmos a Verdade. 

[...] Nos achamos numa tremenda crise, quer reconheçamos, quer não. E, no meio desta crise, não podemos continuar seguindo um livro anacrônico ou um guia qualquer; temos de encontrar a Verdade no nosso próprio coração, e só a encontraremos se nossa mente estiver "descondicionada". Enquanto houver o condicionamento que nos faz buscar, seguir, ou criar ideologias e adorar ídolos; enquanto houver condicionamento da nossa mente, nos fazendo proceder como hinduístas, comunistas, socialistas, capitalistas, ou o que quer que seja, não encontraremos a Verdade contida em problema algum. Só quando vocês e eu descobrimos a Verdade, que não é pessoal, individual, haverá a possibilidade de se promover uma revolução que não seja uma revolução de ideias, mas a revolução da Verdade. Dela necessitamos nos tempos atuais. 

Importa igualmente descobrir qual é a relação de vocês para com a Realidade Criadora, ou como quiserem chamá-la — pois os nomes não têm importância. Essa Realidade Criadora nunca será encontrada, enquanto a mente de vocês estiver cristalizada, atulhada de ideias e palavras sem nenhuma significação. Não a encontrarão, não a descobrirão, se a mente de vocês não é capaz de se libertar do pensamento tradicional. 

A Verdade não é uma estrutura mental. A mente não pode perceber a Verdade. A Verdade não é produto da mente; ao contrário, enquanto a mente estiver em atividade, tentando imaginá-la, descobri-la, desenterrá-la, jamais a encontrará. Apenas a encontrará, quando houver a compreensão que liberta a mente e lhe dá a única possibilidade de profundo silêncio. É essencial uma mente silenciosa, uma mente tranquila, de uma tranquilidade que não é produzida por disciplina, coerção ou persuasão. Uma mente disciplinada não é uma mente livre; uma mente estreita, condicionada, é incapaz de compreender o que é a Verdade. A mente, porém, que compreende, que penetra, capaz de "experimentar" diretamente, na ação, nas relações, no viver de cada dia — essa mente é também capaz de descobrir a Verdade; e essa Verdade é que nos liberta dos problemas.

[...] Os problemas são criados pelo nosso pensar, nosso viver, nossas ações, e queremos achar uma solução fora dos nossos pensamentos, nossas atividades e relações de cada dia. Por isso estamos sempre à espera de alguém que nos diga o que devemos fazer. E como há sempre quem esteja muito disposto a nos dizer o que devemos fazer, a essas pessoas chamamos líderes, guias; consequentemente, no fim de nossa busca encontramos a busca, a frustração, a desesperança, a amargura; nossa vida foi toda desperdiçada; e começa a desintegração do nosso próprio ser. Assim, pois, só no estudo  do problema pode ser encontrada uma solução verdadeira.

Jiddu Krishnamurti em Autoconhecimento — Base da Sabedoria

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Existe algo além da medida das palavras e do pensamento?

O homem procura algo para além do transitório. provavelmente desde tempos imemoriais, tem perguntado a si próprio se há alguma coisa que seja sagrada, alguma coisa que não pertença a este mundo, que não seja arquitetada pelo pensamento, pelo intelecto. Tem sempre querido saber se haverá uma realidade, um estado intemporal não inventado, não projetado pelo pensamento, um estado da mente em que o tempo realmente não existe; se haverá algo "divino", "sagrado", "santo" — se podemos usar essas palavras — que não seja perecível. 

As religiões organizadas parecem ter dado a resposta. Dizem que existe uma Realidade, que há um Deus, que há algo que a mente não é capaz de medir. Começam então a organizar o que consideram ser o real, e o homem é desviado para o caminho errado. Talvez vocês se lembrem da história acerca do Diabo, que andava a passear com um amigo. Viram um homem à sua frente inclinar-se e apanhar alguma coisa do chão. Quando a apanhou e a olhou, tinha no rosto uma grande alegria. O amigo do Diabo perguntou a este o que é que o homem apanhara e o Diabo respondeu: "Foi a verdade." O amigo disse: "Isto é muito mau para você, não é?" E o Diabo respondeu: "De modo nenhum, vou ajudá-lo a organizá-la..."

O culto de uma imagem, criada pelas mãos ou pela mente, e os dogmas e rituais da religião organizada, com o eu sentido de beleza, são considerados muito veneráveis e sagrados. Assim o homem, na sua busca daquilo que está além de toda a medida, para além de todo o tempo, é iludido, logrado e aprisionado, porque está sempre na esperança de encontrar algo que não seja inteiramente deste mundo. Afinal, que é que as sociedades tradicionais, burocráticas, capitalistas ou comunistas, têm realmente para oferecer? Muito pouco além de alimentação, habitação e vestuário. Talvez se possam ter mais oportunidades para trabalhar ou se possa ganhar mais dinheiro, mas no aspecto mais profundo, quando se observa, essas sociedades têm muito pouco para dar; e a mente, se é de fato inteligente e acordada, recusa isto. Fisiologicamente, alimentação, habitação e vestuário são necessários, absolutamente essenciais. Mas quando isso se torna o mais importante, a vida perde então o seu maravilhoso sentido. 

Assim, valeria a pena, esta tarde, gastarmos algum tempo a descobrir por nós mesmos se há realmente algo sagrado, algo não construído pelo pensamento, pelas circunstâncias, que não seja resultado da propaganda.

Valeria a pena, se possível, aprofundar esta questão, porque, a não ser que se encontre algo que esteja para além da medida das palavras, do pensamento, de qualquer experiência, a vida de todos os dias torna-se extremamente superficial. Talvez seja por isso — mas também pode ser que não — que a geração presente recusa esta sociedade e procura algo para além da luta, da fealdade e da desumanidade quotidianas. 

Podemos então penetrar no problema: "Que é uma mente religiosa? Qual é o estado da mente capaz de ver o que é a verdade?"(...)

Krishnamurti em, O mundo somos nós

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Todo defunto pensa que sabe o que a vida é

Os Mestres não falam a verdade. Mesmo se eles quiserem eles não podem, é impossível. Então, qual a função deles? O que eles continuam fazendo? Eles não podem dizer a verdade, mas eles podem provocar a verdade que está profundamente adormecida em você. Elas podem provocá-la, desejá-la. Eles podem lhe sacudir, eles podem lhe acordar. Eles não podem lhe dar Deus, verdade, nirvana, porque em primeiro lugar você já tem tudo isso em você. Você nasce com isto. É inato, intrínseco. É a sua própria natureza. Então qualquer pessoa que finja lhe dar a verdade está simplesmente explorando sua estupidez, sua credulidade. Ele é esperto — esperto e completamente ignorante também. Ele não sabe nada, nem mesmo um vislumbre da Verdade aconteceu a ele. Ele é um pseudoMestre. 

A verdade não pode ser dada; ela já está em você. Ela pode ser suscitada, ela pode ser provocada. Um contexto pode ser criado, um certo espaço pode ser criado no qual ela surja em você e não esteja mais adormecida, torne-se desperta. 

A função do mestre é bem mais complexa do que você pensa. Ela teria sido bem mais fácil, bem mais simples, se a verdade pudesse ser transmitida. Ela não pode ser transmitida; logo, é preciso usar meios e caminhos indiretos

No novo testamento há a bela história de Lázaro. Os cristãos perderam todo sentido dela. Jesus é tão infeliz — ele esteve na companhia de pessoas erradas. Nem mesmo um único teólogo cristão foi capaz de descobrir o significado da história de Lázaro, sua morte e sua ressurreição... Se Lázaro estava morto ou não, não é o que importa. Envolver-se nessas questões estúpidas é um absurdo. Somente eruditos podem ser tão bobos...

Vocês estão todos mortos. Vocês estão todos na mesma situação de Lázaro. Vocês estão todos em suas grutas escuras. Vocês estão todos fedendo e deteriorando... porque a morte não é uma coisa que vem um dia de repente — vocês estão morrendo todos os dias. Desde o dia de seu nascimento você está morrendo. É um longo processo; leva-se setenta, oitenta, noventa anos para completá-la. A cada momento alguma coisa de você morre, alguma coisa em você morre, mas você está absolutamente inconsciente da situação toda. Você continua como se estivesse vivo; você continua como se soubesse o que a vida é.

A função do Mestre é chamar: "Lázaro, saia da gruta! Saia do seu túmulo! Saia da morte!"

O Mestre não pode lhe dar a verdade, mas ele pode provocá-la. Ele pode mexer algo em você. Ele pode dar início a um processo em você, que vai inflamar um fogo, uma chama

A verdade já é você — simplesmente juntou muita poeira ao seu redor. A função do Mestre é negativa: ele tem que lhe dar um banho, uma chuveirada, então a poeira desaparece. 

Este é exatamente o significado do batismo cristão. Isto é o que João Batista estava fazendo no rio Jordão. Mas as pessoas continuam entendendo errado. Hoje o batismo acontece nas igrejas; ele é sem sentido. 

João Batista estava preparando as pessoas para um banho interno. Quando elas estivessem prontas ele as levaria simbolicamente para dentro do rio Jordão. Aquilo era somente simbólico... simbolizando que o Mestre pode lhe dar um banho. Ele pode tirar a poeira, a poeira de séculos para fora de você. E de repente tudo está límpido, tudo é claridade. Essa claridade é iluminação. 

(...) Os Mestres não ensinam a verdade, não há como ensiná-la. É uma transmissão além das escrituras, além das palavras. É uma transmissão. É energia provocando energia em você. É um tipo de sincronicidade... Começou um processo em você que lhe revela a verdade do seu ser. Você se vê face a face com você. Deus não está em algum outro lugar: ele está aqui, agora.

OSHO  

domingo, 28 de setembro de 2014

A mentira não pode transformar-se na verdade

Quando carregamos o fardo dos “você deve” e “você não deve”, impostos a nós pelos outros, ficamos como este personagem roto e sofrido, pelejando para abrir seu caminho morro acima. “Mais depressa! Mais força! Tente chegar ao alto!”, grita o tolo tirano que essa figura triste leva às costas, enquanto o próprio tirano, por sua vez, tem às costas um galo dominador. Se a vida nestes dias está lhe parecendo apenas uma luta ininterrupta desde o berço até o túmulo, pode ser a hora de arriar a carga dos seus ombros e experimentar caminhar sem ter de carregar às costas essas figuras. Você tem suas próprias montanhas a conquistar, seus próprios sonhos a realizar, mas nunca haverá energia suficiente para ir atrás dessas metas enquanto você não se desfizer de todas as expectativas que lhe foram impostas pelos outros, e que agora você pensa que são suas. Há a possibilidade de que essas expectativas estejam apenas na sua mente, mas isso não significa que elas não possam jogá-lo ao chão. É hora de arriar a carga, e dizer a essas figuras que sigam o seu próprio caminho.

A verdadeira vida de um homem é o caminho no qual ele se desfaz das mentiras que lhe foram impostas pelos outros. Desprovido das roupas, nu, ao natural, ele é aquilo que é. Trata-se aqui de ser, e não de vir a ser. A mentira não pode transformar-se na verdade, a personalidade não pode transformar-se na sua alma. Não existe maneira de transformar o não-essencial em essencial. O não-essencial permanece não-essencial, e o essencial permanece essencial, eles não são conversíveis. Esforçar-se pela verdade só vai criar mais confusão. A verdade não precisa ser conquistada. Ela não pode ser conquistada, pois já está aí. Apenas a mentira é que precisa ser descartada. Todos os anseios, propósitos, ideais e metas, todas as ideologias, religiões e sistemas de aperfeiçoamento, de melhoramento, são mentiras. Cuidado com tudo isso. Reconheça o fato de que do jeito como você é agora, você é uma mentira, resultado de manipulação, produzido pelos outros. A busca da verdade é de fato uma distração e um adiamento. É a fórmula encontrada pela mentira para disfarçar-se. Olhe a mentira de frente, examine a fundo a falsidade que é a sua personalidade. Pois encarar a mentira é parar de mentir. Deixar de mentir é desistir de buscar alguma verdade, não há necessidade disso. No momento em que desaparece a mentira, ali está a verdade em toda a sua beleza e esplendor. Encarando-se a mentira ela desaparece, e o que fica é a verdade.

Osho em, Osho Zen Tarot

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

A verdade não é produto de posse e venda

Pergunta: A Verdade é relativa ou absoluta?

Krishnamurti: Em primeiro lugar, examinemos através das palavras o significado da pergunta. Queremos alguma coisa absoluta, não é? A ânsia humana é por alguma coisa permanente, fixa, inabalável, eterna; algo que não sofra decadência, que não experimente a morte — uma ideia, uma sensação, um estado eterno, para que a mente se lhe apegue. Temos que entender essa ânsia, antes de podermos compreender a pergunta e respondê-la acertadamente. 

A mente humana deseja permanência em tudo — dos relacionamentos, das propriedades, das virtudes. Ela deseja algo que não possa ser destruído. Por isso dizemos que Deus é permanente ou que a verdade é absoluta. 

Mas o que é a verdade? Será a verdade algum extraordinário mistério, algo longínquo, inimaginável, abstrato? Ou será algo que você descobre de momento a momento, de dia em dia? Se ela puder ser acumulada, amealhada através da experiência, então não será a verdade; pois, atrás dessa aquisição, jaz o mesmo espírito de cobiça. Se ela é algo muito distante, que só pode ser encontrado através de um sistema de meditação ou da prática da negação e do sacrifício, também nesse caso não será a verdade, pois também isso é um processo de cobiça. 

A verdade deve ser descoberta e compreendida em toda ação, em todo pensamento, em todo sentimento, por mais triviais ou transitórios que sejam; ela deve ser observada a cada momento de cada dia; deve ser ouvida no que o marido ou a esposa dizem, no que diz o jardineiro, no que seus amigos dizem e no processo de seu próprio pensamento. Seu pensamento pode ser falso, pode estar condicionado, limitado; e, descobrir que seu pensamento está condicionado, limitado, essa é a verdade. Essa mesma descoberta liberta a mente da limitação. Se você descobrir que é cobiçoso — se o descobri, e não for simplesmente informado disso por outrem — essa descoberta terá a verdade, e essa verdade exercerá sua própria ação sobre a sua cobiça. 

A verdade não é algo que você possa amealhar, acumular, armazenar e depois se apoiar nela como num guia. Isso seria apenas outra forma de posse. E é muito difícil para a mente não adquirir, não armazenar. Quando você compreende o que isso significa, verá que coisa extraordinária é a verdade. A verdade é intemporal, mas no momento em que você a captura — como quando diz: "Encontrei a verdade, ela é minha" — ela já não será a verdade. 

Portanto, se a verdade é "absoluta" ou intemporal depende da mente. Quando a mente diz: "Quero o absoluto, algo que nunca degenere, que não conheça a morte", o que ela realmente deseja é algo permanente a que se apegar; por isso ela cria o permanente. Mas a mente que está consciente de tudo o que se passa no seu exterior e em seu próprio interior e vê a verdade disso — essa mente é intemporal; e só uma mente assim pode conhecer aquilo que está além dos nomes, além do permanente e do impermanente.

Krishnamurti em, O VERDADEIRO OBJETIVO DA VIDA

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Debater é um ato de violência

Todas as discussões são tolas porque provocam um clima no qual qualquer entendimento entre duas pessoas se torna impossível; no qual qualquer coisa é sempre mal-interpretada.

Debater é um ato de violência. Através dele, a verdade pode ser assassinada, mas não ressuscitada. O debate é sempre violento. Nele, sua própria atitude é violenta.

Na realidade, você não está em busca da verdade, está em busca da vitória. Quando a vitória é a meta, a verdade é sacrificada. Quando a verdade é a meta, você pode sacrificar a vitória.

Apenas a verdade pode ser a meta; a vitória não. Quando a vitória é a meta, você se torna um político, não um homem religioso. Você fica agressivo, fica tentando vencer o outro. A verdade não pode ser uma vitória quando essa vitória significa derrotar alguém. A verdade traz humildade, modéstia. Não é uma "viagem" de ego como são todos os debates. O debate nunca conduz ao real; sempre caminha para o ilusório, para o não-verdadeiro porque a própria sensação de vitória é tão estúpida!

Verdade significa: nem "você" nem "eu". Na discussão, ou você vence ou eu venço; a verdade nunca é a vencedora.

Como você pode entender o outro se está contra ele? O entendimento é impossível. O entendimento necessita de simpatia, de participação. Entender significa ouvir o outro totalmente: apenas desse modo acontece o florescimento. Ao discutir, debater, argumentar, racionalizar, você não ouve o outro. Apenas finge ouvir e, interiormente, fica se preparando. Por dentro, você está sempre se preparando para a tacada seguinte, pronto para rebater quando o outro parar. Você fica se preparando para refutar. Não ouve. fica tramando como irá refutar o outro.

Na discussão, no debate, a verdade não é significativa. Por isso, num debate, a comunicação nunca acontece; é impossível atingir a comunhão. Você pode argumentar e quanto mais argumentar mais se separará do outro. Quanto mais argumentar, maior será a brecha - torna-se um abismo. Nenhum encontro poderá acontecer. É por isso que os filósofos nunca se encontram. O mesmo acontece com os eruditos. Eles são grandes polemistas - o abismo existe. Eles não podem se encontrar. É impossível.

Apenas os amantes se encontram, mas amantes não debatem, comunicam-se. Quando você argumenta a brecha se alarga. Se você estiver argumentando, não poderá haver uma ponte sobre o abismo. Verdade significa não argumentar.

Osho — Nem água, nem Lua

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

O que buscamos de fato: verdade, felicidade ou satisfação?

Presumivelmente, a maioria de vocês tem um instrutor de alguma espécie, não é verdade? Alguma espécie de "guru", lá no Himalaia, ou por aqui mesmo. Não é verdade isso? Alguma espécie de guia. Ora, por que precisam dele? Naturalmente, não necessitam dele para fins materiais, a não ser que lhes prometa um bom emprego para depois de amanhã. Assim sendo, presumo que o necessitam para fins psicológicos, não é mesmo? Pois bem, por que necessitam dele? Fundamentalmente, é claro que dele necessitam, porque dizem: "Estou confuso; não sei como viver neste mundo; as coisas são muito contraditórias. Há confusão, há sofrimento, há morte, decadência, degradação, desintegração, e preciso de alguém para me aconselhar no que fazer". Não é esta a razão pela qual necessitam de um guru, por que se dirigem a um guru?

Vocês dizem: "Confuso como estou, necessito de um instrutor para me ajudar a esclarecer a confusão, ou, melhor, para me ajudar a dissolver a confusão". Não é isso? A necessidade de vocês, portanto, é psicológica. Vocês não consideram o Primeiro Ministro como o guru de vocês, visto que ele se ocupa, meramente, da existência material da sociedade. Vocês apelam para ele a fim de que atenda às suas necessidades físicas; enquanto, aqui, vocês procuram um instrutor par atender às suas necessidades psicológicas. 

Mas, o que é que vocês entendem pela palavra "necessidade"? Preciso de um pouco de sol, preciso de alimento, de roupas, e de moradia; preciso, da mesma forma, de um instrutor? Para responder a essa pergunta, devo descobrir quem criou essa terrível confusão que me rodeia e que também está em mim. Se sou responsável pela confusão, sou eu, então, a única pessoa que poderá dissipar a confusão, o que significa que preciso compreender a confusão; mas vocês, em geral, procuram um instrutor para que ele os liberte da confusão, ou lhes mostre o caminho, ou lhes dê instruções sobre a maneira de proceder em face da confusão. Ou dizem: ""Este mundo é falso, e preciso achar a Verdade". E o guru, instrutor diz: "Eu achei a verdade" — e por isso vocês vão a ele para compartilhar aquela verdade. 

Pode a confusão ser dissipada por outra pessoa, por maior que seja tal pessoa? É bem certo que essa confusão existe nas nossas relações, e que, portanto, precisamos compreender as nossas relações recíprocas, as nossas relações com a sociedade, com a propriedade, as ideias, etc.; e pode alguém nos dar a compreensão dessas relações? Alguém pode nos apontar ou mostrar isso ou aquilo, mas é a mim que compete compreender as minhas relações, a minha posição. Senhor, isso lhe interessa? Encontro dificuldade, porque sinto que você não está interessado: está observando outra pessoa fazendo alguma coisa. Quando vocês fazem uma pergunta, não compreendem a importância de prestar atenção à resposta. Por conseguinte, estão fazendo pouco caso de seu guru e da confusão de vocês. Em verdade, pouco lhes importa o que diz o seu guru e só o procuram por hábito. Consequentemente, a vida não tem importância para vocês, ela não é energia, não é criação, não é algo que precisa ser compreendido. E, posso ler isso na fisionomia de vocês, não estão seriamente interessados nesta questão. Vocês escutam, ou para se justificarem na sua busca de gurus, ou para fortalecer a própria convicção de que os gurus são necessários. Mas, dessa maneira não encontraremos a verdade que esta questão encerra. Vocês só podem encontrar a verdade contida nesta questão, se esquadrinharem o seu coração para acharem a razão do por que necessitam de um guru. 

Há, pois, muitas coisas contidas nesta questão. Parece que julgam que a verdade é estática, e que, por isso, um guru pode levá-los aonde está. Assim como um homem pode indicar o caminho da estação, assim também julgam que um guru pode mostrar-lhes o caminho da Verdade. Significaria isso que a Verdade é estática; mas, será estática a Verdade? Bem gostariam que o fosse, porquanto tudo o que é estático satisfaz, pois, pelo menos, sabem o que é e podem conservá-lo em suas mãos. De sorte que o que buscam, em verdade, é só satisfação. Desejam segurança, desejam a garantia de um guru, desejam que ele lhes diga: "Você está indo muito bem, continue" — desejam que ele lhes dê conforto mental, que lhes anime, emocionalmente. Assim sendo, procuram, invariavelmente, um guru que de fato lhes satisfaça. Essa é a razão de haver tantos gurus e tantos discípulos; o que significa que realmente não buscam a verdade, mas somente satisfação; e o homem que lhes der o máximo de satisfação, esse homem chamaram de o guru de vocês. Tal satisfação, ou é neurológica, isto é, física, ou psicológica; e, na presença do guru, pensam sentir uma paz profunda, uma grande tranquilidade, uma impressão de ser compreendido. Por outras palavras, querem um pai ou uma mãe glorificados, para ajudar-lhes a vencer a dificuldade. Senhor, você já este sentado tranquilamente à sombra de uma árvore? Aí também se encontra uma paz profunda. Aí também nos sentimos compreendidos. Por outras palavras, na presença de uma pessoa muito tranquila, ficamos igualmente tranquilos; e atribuem essa tranquilidade ao instrutor e o rodeiam de grinaldas, enquanto tratam a pontapés o empregado de vocês. Assim, pois, quando dizem que necessitam de um guru, nisso estão implicadas todas essas coisas, não é verdade? E o guru que lhes garante a fuga, torna-se para vocês uma necessidade.

A confusão só existe nas relações entre indivíduos; mas, porque necessitamos de alguém para nos ajudar a compreender esta confusão? Dirão, agora, porventura: "O que você está fazendo? Não está agindo como nosso guru? — Certamente, não estou procedendo como guru de vocês, primeiro, porque não estou dando-lhes satisfação alguma, e, depois, porque não estou dizendo-lhes o que devem fazer, momento por momento, dia por dia. Estou apenas a apontar-lhes uma coisa; vocês a podem levar ou deixar ficar — e isso depende de vocês e não de mim. Nada peço de vocês: nem adoração, nem adulação, nem insultos, nem os seus deuses. Eu só digo: "isso é um fato; levem ou o deixem ficar". Mas a maioria de vocês o deixará ficar, pela razão muito clara de não encontrar nele satisfação. Mas o homem que é realente sincero, verdadeiramente ardoroso na sua intenção de descobrir, encontrará nutrição suficiente no que estamos dizendo, ou seja, que a confusão só existe nas relações de vocês. Tratemos, por conseguinte, de compreender essas relações. 

Jiddu Krishnamurti em, O Que Te Fará Feliz?

quinta-feira, 17 de julho de 2014

A compreensão não surge através do isolamento

É muito importante compreender todo o processo do nosso pensamento, e essa compreensão não surge através do isolamento. Não existe uma vida isolada. A compreensão do processo do nosso pensamento surge quando nos observamos nos nossos relacionamentos diários, nas nossas atitudes, nas nossas crenças, a maneira como falamos, a maneira como olhamos as pessoas, a maneira como tratamos nossos maridos ou nossas esposas e nossos filhos. O relacionamento é o espelho no qual se refletem os processos do nosso pensamento. Nos fatos do relacionamento se encontra a verdade, não fora do relacionamento. Não existe, é claro, a vida isolada. Podemos, cuidadosamente, eliminar diversas formas de relacionamento físico, mas, ainda assim, a mente permanecerá relacionada. A própria existência da mente implica relacionamento, e o autoconhecimento advém de se enxergarem os fatos do relacionamento tais como eles são, sem inventar, condenar ou justificar. No relacionamento, a mente faz certas avaliações, julgamentos e comparações; ela reage ao desafio de acordo com as várias formas de recordação, e essa reação é chamada de pensamento. Você descobrirá que, se a mente puder ao menos estar ciente de todo o processo, o pensamento se imobiliza. A mente então fica bastante quieta, bastante silenciosa, sem incentivo, sem movimento em qualquer direção, e, nessa quietude, a realidade adquire existência.

Krishnamurti, Rajghat, 6 de fevereiro de 1955

sexta-feira, 11 de julho de 2014

É possível a mente humana perceber a verdade?

Pergunta: É possível a mente humana poder perceber a verdade?

Krishnamurti: Pode a mente humana perceber a verdade? Acho que não pode. O que é presentemente a mente humana? Existe uma mente humana, ou é meramente a resposta instintiva do animal que continua em nós? Não é uma observação sarcástica!

Em primeiro lugar, para perceber qualquer coisa na vida, e muito mais a verdade - para perceber a minha mulher, o meu vizinho, o meu filho - tem que existir uma certa calma na mente, não uma calma disciplinada - nesse caso não é calma, é uma mente sem vida. Ora, uma mente em conflito não deixa observar nada, observar eu próprio. Portanto, estou em permanente conflito, em constante movimento, a mexer, mexer, a falar, eternamente a fazer perguntas, a explicar; aí não é possível haver qualquer observação. É isso que a maior parte de nós faz, quando estamos perante 'o que é'. Portanto, vemos que só pode haver observação quando não há conflito. Para não haver conflito, podemos tomar um tranquilizante, um comprimido, para ficarmos tranquilos, mas não é isso que dá percepção, isso faz-nos é dormir; e isso é provavelmente o que a maior parte de nós quer. Ora, para observar, tem que haver uma certa tranquilidade na mente; e se se vê ou não o que é a verdade, depende da qualidade da mente.

A verdade não é algo estático. A verdade não é algo fixo - que não tem poder. É algo que deve ser vivo, tem que ser extraordinariamente sensível, vivo, dinâmico, vital. E como é que uma mente pútrida e débil que está em tumulto, permanentemente mordida pela ambição - como é que pode compreender isso? Pode dizer que há a verdade e repeti-lo continuamente e deixar-se adormecer.

Assim, a questão é, realmente, não se a mente humana pode compreender a verdade, mas se é possível derrubar os muros da mesquinhês que o homem construiu à sua volta e a que chama mente - essa é de facto a questão. Um dos muros de que todos nós gostamos tanto é a autoridade.

- 'Collected Works' [Colectânea], vol. 13, 1962-1963. Revolução Psicológica Varanasi, Índia

2ª Palestra Pública, 3 de Janeiro, 1962
© Krishnamurti Foundation of America
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill