Se você se sente grato por este conteúdo e quiser materializar essa gratidão, em vista de manter a continuidade do mesmo, apoie-nos: https://apoia.se/outsider - informações: outsider44@outlook.com - Visite> Blog: https://observacaopassiva.blogspot.com

terça-feira, 20 de março de 2018

O que é a cultura?


O QUE É A CULTURA?

Pupul Jayakar (PJ): Krishnaji, há um fenômeno externo no mundo de hoje, onde o Oriente se estende para o Ocidente para encontrar apoio, e o Ocidente se estende para o Oriente para encontrar, entre citações, “sabedoria” que possa preencher certo vazio. Pergunto: Há uma mente indiana capaz de conter os mesmos elementos de dor, cobiça, ira, etc., que a mente ocidental, mas na qual o solo do qual brotam estes elementos é diferente?

Jiddu Krishnamurti (K): Você pergunta se o pensamento oriental, a cultura orienta, o modo de vida oriental, é diferente do ocidental?

PJ: Bem,é óbvio que o modo de vida indiano é distinto do modo do Ocidente...

K: O é.

PJ: Sim, porque os condicionamentos de ambos são diferentes. Mas, em certo sentido, se complementam entre si.

K: De que maneira?

PJ: No sentido de que o Oriente, ou mais especificamente, a Índia, carece quem sabe da precisão necessária para levar uma abstração até a ação correta.

K: Você disse que na Índia vivem mais sem a abstração?

PJ: Sim. Não se interessam tanto na ação com respeito ao meio ou a ação como tal.

K: Você diria que eles se interessam em que?

PJ: Hoje em dia, desde cedo, está tendo lugar uma grande mudança. É muito difícil dizer que é a mente indiana, porque a mente indiana está hoje — em um nível — buscando as mesmas comodidades materiais.

K: Está buscando o progresso no mundo tecnológico, e o aplica na vida cotidiana, etc.

PJ: Sim, o progresso no mundo tecnológico e a ansiedade de consumo tem se infiltrado muito fundo no espírito indiano.

K: Então, qual é, finalmente, a diferença entre a cultura indiana e a cultura ocidental?

PJ: Talvez, apesar desta insinuação do material, ainda há na Índia certo discernimento nas coisas devido a um espaço interno que subsiste para todo o processo da exploração profunda. Na Índia, o processo de aprofundar, de inquirir, penetra o campo interior do ser. Durante séculos, a mente indiana tem se nutrido neste sentimento. Enquanto que, no Ocidente, desde a época mesma dos gregos, sempre tem havido um movimento para fora, para o externo, para o ambiente.

K: Compreendo. Outro dia escutei na televisão uma entrevista que faziam a uma personalidade indiana muito conhecida. Disse que o mundo tecnológico está hoje humanizando à mente indiana. Pergunto-me o que quis dizer com isso. Quis dizer, por acaso, que em vez de viver na abstração e em teorias, com toda a complexidade da ideação, etc., o mundo tecnológico está baixando aos indianos à terra?

PJ: E talvez, até certo ponto, isso seja necessário.

K: Evidentemente, é necessário.

PJ: Portanto, se estas duas mentes tem uma essência distinta...

K: Eu ponho isso muito em dúvida. Questiono que o pensamento seja, de modo algum, oriental ou ocidental. Veja, só há pensamento. Não é pensamento oriental ou pensamento ocidental. A expressão do pensamento pode ser que seja distinta na Índia e no Ocidente, mas isso segue sendo um processo de pensamento.

PJ: Mas, não é verdade também que aquilo que as células do cérebro contém no Ocidente e os séculos de conhecimento e a assim chamada sabedoria têm entregue às células cerebrais no Oriente, fazem que percebam de maneira distinta?

K: Se me permite, gostaria de questionar o que você disse. Encontro que quando vou à Índia, há muito mais materialismo agora do que costumava ter. Há mais interesse no dinheiro, na posição social, no poder e tudo isso. E, é claro, há superpopulação e todas as complexidades da sociedade moderna. Você está dizendo que a tendência da mente indiana à busca interna, é muito maior que a da mente ocidental?

PJ: Diria que sim, que existe o meio interno e o meio externo, e que o meio externo constitui o interesse do Ocidente, enquanto que o meio interno tem sido o interesse do Oriente.

K: Tem sido o interesse, sim; mas isso tem sido o interesse de muito, muito poucas pessoas.

PJ: Mas são esses poucos os que criam a cultura.

K: Sim. Bem, até onde posso vê-lo — talvez esteja equivocado — o mundo ocidental se interessa muito mais nos assuntos mundanos.

PJ: Mas o que é que o voltou nessa direção?

K: A política, a economia, a localização geográfica e o clima.

PJ: Não, veja, se fosse somente o clima, então a Índia, México e a África Equatorial, haveriam tido a mesma mente. Mas não a tem. Portanto, essa não é a resposta.

K: Não, claro que não. Não é tão só o clima. É todo o assim chamado modo religioso de vida ocidental, que é muito diferente do oriental.

PJ: Assim é. É o que estou dizendo. Digo que, em alguma parte do longo trajeto, há pessoas de um mesmo tronco racial, aparentemente divididas.

K: Divididas, sim.

PJ: No Ocidente, houve descobrimento e diálogo com a natureza. Mas o Ocidente se voltou numa direção que conduziu à tecnologia e a todas as grandes verdades científicas. A Índia também teve um diálogo com a natureza e com o ser, mas os diálogos foram, em si mesmos, de um tipo diferente.

K: Você está dizendo, pois, que a mente oriental, a mente indiana, seja mais em questões religiosas que a mente ocidental?

PJ: Sim, é o que eu digo.

K: Aqui, no Ocidente, tudo é bem mais superficial — ainda que eles pensem que é bastante profundo —, e lá, na Índia, a tradição, a literatura e tudo, diz: “O mundo não é tão importante como a compreensão do ser, a compreensão do universo, a compreensão do cosmos, do princípio supremo: brahman”.

PJ: Sim. A rapidez com que a mente pode começar a investigação é talvez distinta no Ocidente, onde a investigação e as grandes percepções têm seguido em outra direção.

K: No Ocidente, como vemos, tratando-se de assuntos religiosos, há uma negação absoluta da dúvida, o asceticismo e o questionamento. Ali a fé é sumamente importante. Mas nas religiões indianas, o budismo, etc., a dúvida, o questionamento e a investigação chegam a ser de extrema importância.

PJ: Hoje em dia ambas as culturas estão em crise.

K: Sim, claro, ambas as culturas estão em crise. Pupul, você diria que não são tão só as culturas senão toda a consciência humana que está em crise?

PJ: Sim. Bem, você distinguiria a consciência humana, da cultura?

K: Não.

PJ: Em certo sentido, são a mesma coisa.

K: Sim, basicamente são o mesmo; não são diferentes.

PJ: Por isso a crise, na raiz mesma, os têm feito buscar em alguma parte fora deles mesmos. Percebem a insuficiência, então se voltam para a outra cultura. Está ocorrendo em ambos mundos.

K: Sim, mas você vê isso, Pupul, os ocidentais, ao encarar a busca a partir de sua perspectiva materialista — se posso usar essa palavra —, caem aprisionados não só em ideias supersticiosas, românticas, ocultas, senão que também são aprisionados por estes gurus que vem para o Ocidente. O que desejo averiguar é se a consciência humana — que se acha em crise — pode não somente resolver essa crise sem gerar guerras, sem destruir à humanidade, senão também se os seres humanos podem alguma vez ir mais além de sua própria limitação. Não sei se me expresso com clareza.

PJ: Senhor, o externo e o interno são como duas imagens refletidas das direções em que o homem tem se movido. O problema é que, se o homem realmente tem de sobreviver, ambas as imagens tem que estar...

K: Ambas têm que conviver.

PJ: Não, não só conviver, senão que deve nascer uma cultura humana que contenha a ambas.

K: Sim, assim é. Bem, agora, o que você entende pela palavra “cultura”? O que é para você a palavra “cultura”?

PJ: A cultura, não é tudo o que o cérebro contém?

K: Ou seja, você diria que a cultura é o aprendizado do cérebro, o refinamento do cérebro e a expressão desse refinamento na ação, na conduta, na religião, e que também é um processo de investigação que conduz a algo totalmente incontaminado pelo pensamento? Eu diria que isso é a cultura.

PJ: A investigação, a incluiria no campo da cultura?

K: É claro.

PJ: Não é a cultura um circuito fechado?

K: Você pode convertê-la num circuito fechado ou pode romper o circuito e ir mais além.

PJ: Mas hoje em dia a cultura, tal como existe, é um circuito fechado.

K: Por isso quero saber o que você entende pela palavra “cultura”.

PJ: A cultura, tal como hoje conhecemos, é a soma de nossas percepções, a maneira como olhamos as coisas, nossos pensamentos, nossos sentimentos, nossas atitudes, a operação de nossos sentidos...

K: Prossiga.

PJ: Você pode seguir adicionando a isto.

K: Ou seja, religião, fé, crença, superstição.

PJ: Todo o externo e o interno...

K: Sim.

PJ: ... que continua crescendo, mas crescendo dentro desse contorno. Segue sendo um contorno. E quando você fala de uma investigação, que de nenhum modo está relacionado com isto, a incluiria no campo da cultura?

K: É claro. Você diria — só trato de clarificar a questão — que o movimento total da cultura é como uma maré que sai e entra, e que o empenho humano é este processo de sair e entrar, sem que investiguemos jamais se esse processo pode deter-se alguma vez? Compreende? O que quero dizer é que nós atuamos e reagimos.

PJ: Sim.

K: Essa é a natureza humana, como o fluxo e o refluxo da maré. Reajo, e dessa reação atuo, e a partir dessa reação, e assim sucessivamente. Para frente e para trás.

PJ: Sim.

K: Bem, agora, pergunto se esta reação de recompensa e castigo pode deter-se e tomar um rumo completamente diferente. Nossas vidas, nossas funções, nossas reações se baseiam na recompensa e no castigo, tanto física como psicologicamente. Correto?

PJ: Correto.

K: E isso é tudo quanto conhecemos. Existe esta reação de recompensa e fuga do castigo, etc., igual à maré. Pergunto, então, se há outro sentido de ação que não este baseado nesta ação-reação. Compreende do que estou falando?

PJ: Como esta ação-reação é um impulso das células cerebrais...

K: Sim, é claro, é claro.

PJ: Assim é como respondem as células cerebrais e a maneira como recebem através dos sentidos.

K: Nossa pergunta era, na realidade: O que é a cultura?

PJ: E a investigamos.

K: Um pouquinho.

PJ: Sim, um pouquinho. Pode estender-se mais longe, mas segue estando dentro do mesmo...

K: Sim, está dentro do mesmo campo.

PJ: Você diria, então, que a cultura é o que está contido nas células cerebrais?

K: É claro.

PJ: Alguma outra coisa?

K: Todas as nossas passadas recordações.

PJ: Sim. Então, se você considera tudo isso, há alguma outra coisa?

K: Agora entendo. Esta é uma pergunta diferente, devemos ser cuidadosos, muito cuidadosos; se há alguma outra coisa... sim, há... então essa outra coisa poderá operar sobre as células cerebrais que estão condicionadas. Concorda? Se há algo mais no cérebro, a atividade desse algo mais poderá originar uma liberdade com respeito a esta estreita cultura, limitada. Mas, algo mais dentro do cérebro?

PJ: Krishnaji, se disse que, ainda fisiologicamente, as células cerebrais operam olho por olho em uma mínima porção de sua capacidade.

K: Conheço isso. Por que é assim?

PJ: Porque o condicionamento as limita, e jamais tem estado livres desses processos que...

K: ...as limitam. O qual implica que o pensamento é limitado.

PJ: Sim, isso é apostar tudo numa carta.

K: Assim é como quero fazê-lo. O pensamento é limitado, e todos funcionamos dentro dessa limitação. Correto? A experiência, o conhecimento, a memória e o pensamento são por sempre limitados.

PJ: Que lugar tem nisto os sentidos e os processos perceptivos?

K: Isso levanta outra pergunta. Podem os sentidos operar sem a interferência do pensamento? Compreende minha pergunta?

PJ: Tal como operam hoje, Krishnaji, parecem ter uma raiz: o pensamento. O movimento dos sentidos, assim como funcionam, é o movimento do pensar.

K: Isso é tudo. Portanto, é limitado. Estou investigando, com muitíssima hesitação e certa dose de ceticismo, se as células cerebrais — que tem evoluído através de milhões de anos, que experimentaram sofrimentos indizíveis, solidão, desespero, e trataram de escapar de seus próprios medos apelando a toda forma de esforço “religioso” e demais — podem alguma vez, por si mesmas, transformar e originar dentro delas uma mutação.

PJ: Mas se não originam em si mesmas uma mutação...

K: O que ocorreria?

PJ: ...e não há nada mais?

K: Sim, compreendo sua pergunta.

PJ: Veja, este é o paradoxo. Realmente, senhor, é um paradoxo.

K: Esta é também a eterna pergunta; os hindus a levantaram faz muitíssimo tempo, faz muitos, muitos séculos.

PJ: Sim, sim.

K: “O ‘eu’ superior”... essa é uma maneira errônea de... (sorri) mas a usaremos por momento. Existe um “eu superior” que possa operar sobre o cérebro condicionado?

PJ: Ou se trata melhor, senhor, de se esse “eu superior” possa despertar dentro do cérebro? São duas coisas separadas. Uma é um...

K: ...agente exterior operando.

PJ: Um agente ou uma energia que opera, e a outra é uma ação a partir de dentro das células cerebrais — a porção não utilizada do cérebro —, uma ação que desperta, que transforma.

K: Sim, entendo seu levantamento. Investiguemos, discutamos isso. Há um agente externo, uma energia externa — a chamemos assim momentaneamente — que originará uma mutação nas células cerebrais que se acham condicionadas?

PJ: Posso dizer algo?

K: Sem dúvida, por favor.

PJ: O problema é que essa energia jamais toca realmente as células cerebrais. Há tantos obstáculos que se tem levantado, que o fluir da energia jamais parece tocar e criar...

K: O que é que estamos discutindo?

PJ: Discutimos a possibilidade de uma cultura humana...

K: Uma cultura que não seja...

PJ: ...nem indiana nem ocidental.

K: Sim.

PJ: Uma cultura que contenha toda humanidade, se posso expressá-lo assim...

K: Sim, a toda a humanidade.

PJ: Uma cultura na qual a divisão entre o externo e o interne chegue a seu fim, e onde o discernimento seja discernimento total, e não discernimento no externo ou discernimento no interno.

K: Entendo isso. Qual é, então, a pergunta?

PJ: Então, para isso o instrumento é a célula cerebral.

K: Sim.

PJ: A ferramenta que opera é a célula cerebral.

K: É o cérebro.

PJ: É o cérebro. Bem, agora, algo tem que ocorrer no cérebro.

K: Sim. Eu digo que pode ocorrer, mas sim a ideia de que há um agente externo que, de algum modo, limpa o cérebro que tem sido condicionado, ou inventando um agente externo como o têm feito a maioria das religiões.

A pergunta é: Pode o cérebro condicionado dar-se conta de seu próprio condicionamento e assim perceber sua própria limitação, e então permanecer aí por um instante? Não sei se está claro meu levantamento.

Veja, nós estamos todo tempo tratando de “fazer” alguma coisa, não é assim? Bem, agora, o “fazedor”, é diferente do que está fazendo? Correto? Por exemplo, suponha que me dou conta de que meu cérebro está condicionado, e que todas as minhas atividades, meus sentimentos e minhas relações com os demais são limitadas. Me dou conta disso. E então digo: “Tenho que acabar com essa limitação”. Estou, pois, operando sobre a limitação. Mas o “eu” também é limitado, o “eu” não está separado do outro. Então, podemos estender uma ponte sobre isso? O “eu” não está separado da limitação com a qual está tratando de acabar. Ambas, a limitação do “eu” e a limitação do condicionamento, são similares; não se acham separadas. O “eu” não está separado de suas próprias qualidades.

PJ: Nem está separado do que ele observa. Quando você disse que todo o tempo estamos tratando de fazer alguma coisa...

K: De operar sobre o outro. Toda nossa vida é isso, aparte do mundo tecnológico. “Sou isto e devo mudar para ser aquilo”; e o cérebro está hoje condicionado nesta divisão. O ator é diferente da ação.

PJ: É claro, isso é o que ocorre, sim.

K: E assim, essa condição contínua. Mas, quando você se dá conta de que o ator é a ação, então muda completamente toda a perspectiva. Agora voltamos atrás por um momento. Estamos nos perguntando, Pupulji, o que é que dá origem a uma mudança no cérebro humano, não é assim?

PJ: Esse é realmente o ponto...

K: ...crucial, sim.

PJ: O que é aquilo que coloca fim à divisão?

K: Sim. Investiguemos um pouco mais. O homem tem vivido nesta Terra durante um milhão de anos, mais ou menos, e psicologicamente somos tão primitivos como éramos antes. Basicamente, não temos mudado muito. Nos matamos uns aos outros, buscando o poder, a posição. Estamos psicologicamente corruptos em tudo quanto fazemos hoje no mundo. O que fará que os seres humanos, a humanidade, mude isso?

PJ: Um grande discernimento.

K: Discernimento. Bem, agora, a assim chamada cultura, está impedindo isto? Compreende minha pergunta? Consideremos a cultura indiana. Uma poucas pessoas, como os grandes pensadores, tem investigado esta questão. E a maioria das pessoas só repetem, repetem e repetem. Isso é nada mais que a tradição, uma coisa morta. E eles vivem com uma coisa morta. Concorda? Também aqui, no Ocidente, a tradição tem um tremendo poder.

Ao considerar tudo isto, pergunto: O que fará com que os seres humanos deem origem a uma mutação radical dentro de si mesmos? A cultura tem tratado de produzir certas mudanças na conduta humana. Correto?

PJ: Sim.

K: E as religiões tem dito: “Comporte-se deste modo”, “Não faça isto”, “Não mate”. Mas nós continuamos matando. “Seja fraternal”, e nós não somos fraternais. “Amem-se uns aos outros”, e nós não o fazemos. Está me seguindo? Há decretos, sansões, e nós fazemos completamente tudo o oposto. Concorda?

PJ: Na realidade, ambas as culturas tem se derrubado.

K: Isso é o que quero averiguar. Se tem derrubado e, portanto, já não têm nenhum valor? Por isso o homem hoje se sente perdido? Se voe vai, por exemplo, ao Norte da América, eles não têm uma tradição. Cada qual faz o que deseja, cada qual faz “o seu”. E aqui estão fazendo o mesmo de um modo diferente. Assim, pois, o que é que dará origem a uma mutação das células cerebrais, que então...?

PJ: Na realidade, o que você está dizendo é que não importa se a matriz indiana é diferente, ou se a matriz ocidental é diferente...

K: Ou não diferente.

PJ: Você disse que o problema da mutação no cérebro humano é, em ambos os casos, idêntico.

K: Sim, assim é. Atenhamo-nos a isso. Quero dizer que, ao fim e ao cabo, os indianos — inclusive os mais pobres — sofrem como sofrem aqui no Ocidente. A solidão, o desespero, a infelicidade; tudo isso é exatamente igual que aqui. Esqueçamos, pois, o Oriente e o Ocidente, e vejamos o que impede que tenha lugar esta mutação.

PJ: Senhor, há outro modo de perceber o real?

K: O real. Isso é o que temos sustentado durante sessenta anos: que “o que é”, o real, é muito mais importante que a ideia do real. O ideal, os diversos conceitos e as conclusões não têm em absoluto nenhum valor, já que se está distanciando dos fatos, do que está ocorrendo; e, devido a que nos achamos presos em ideias, ver isso resulta tremendamente difícil.

PJ: Mas, na percepção do real, não há movimento algum do cérebro.

K: Isso é tudo quanto estou dizendo. Os fatos, se você observa muito cuidadosamente, geram em si uma mudança. Não sei se me expresso com clareza.

PJ: Sim.

K: Consideremos a dor: é a dor humana. Não é a dor ocidental ou a dor oriental. A dor não é sua ou minha. E nós sempre tratamos de nos afastar da dor. Bem, agora, poderíamos compreender a profundidade e o significado da dor, não compreender intelectualmente, senão aprofundar de fato na natureza da dor? O que está obstruindo ou bloqueando o cérebro humano, impedindo-lhe de investigar a fundo dentro de si mesmo?

PJ: Senhor, se me permite, quero perguntar uma coisa. Você usa as palavras “aprofundar” e “investigar” dentro de si mesmo. Ambas as palavras se relacionam com o movimento.

K: Com o movimento, sim.

PJ: Sem dúvida, você fala do “findar do movimento”.

K: Sim, é claro, é claro. O movimento é tempo, é pensamento. O findar do movimento... Pode realmente terminar, ou pensamos que pode terminar? Compreende minha pergunta?

PJ: Sim, senhor.

K: Ao fim e ao cabo, as pessoas que têm investigado um pouco este tipo de coisas, tanto no passado como no presente, sempre tem estabelecido uma divisão: a entidade que investiga e o investigado. Essa é a minha objeção. Penso que é o principal bloqueio.

PJ: Então, quando você usa a palavra “investigação”, a usa com o sentido de “percepção”.

K: Perceber, observar, vigiar. Examinaremos isso dentro de um momento, se temos tempo; mas quero voltar a isto, se me permite. O que fará que os seres humanos mudem seu moco de se comportar? Existe esta espantosa brutalidade. O que fará que tudo isto mude? Quem o fará? Não os políticos, não os sacerdotes, não os que falam acerca do meio ambiente, os ecologistas, etc. Eles não têm modificado ao ser humano. Se o homem mesmo não muda, quem o fará? A igreja tem tentado mudar o homem, não é verdade?, e não tem obtido sucesso. As religiões de todo o mundo têm tratado de humanizar ao homem, de fazer com que fosse mais inteligente, mais atencioso e afetuoso. Até agora não têm obtido sucesso. A cultura não tem obtido sucesso.

PJ: Você disse tudo isso, Krishnaji, mas isso só não aproxima o homem à percepção do fato.

K: O que é o que o fará, então? Digamos, por exemplo, que você e outro têm esta percepção. Talvez eu não a tenha. Que efeito tem, então, a percepção de vocês sobre mim? Além do mais, se o outro tem percepção e poder e posição, eu o venero ou o mato. Concorda? Faço, pois, uma pergunta muito mais profunda. Quero descobrir realmente por que os seres humanos, depois de tantos milênios, são assim: Um grupo contra outro, uma tribo contra outra. O horror que avança, avança e avança! Originará uma mudança uma nova cultura? O homem quer mudar? Ou diz: “As coisas estão muito bem, deixemos que sigam assim. Finalmente, alcançaremos certa etapa na evolução”?

PJ: A maioria sente isso.

K: Sim, isso é o que ele tem de espantoso. Finalmente. “Deem-nos outros mil anos e todos seremos humanos maravilhosos”, o que é tão absurdo! Entretanto, estamos nos destruindo um ao outro.

PJ: Senhor, posso perguntar-lhe algo? Qual é o momento real de enfrentarmos ao fato? Qual é a realidade do fato?

K: O que é um fato, Pupul? Outro dia, estávamos discutindo aqui com um grupo de pessoas, a respeito de que um fato é aquilo que nós fizemos e recordamos, e também aquilo que fazemos agora, assim, como o que tenha ocorrido ontem e é recordado hoje.

PJ: Ou inclusive uma onda de medo, de horror que surge, qualquer coisa.

K: Sim, sim.

PJ: Então, como se faz isso realmente...?

K: Espere um momento, sejamos claros quando dizemos que é um fato. O fato do incidente da semana anterior tem passado, mas eu o recordo. Correto? Está o rememorar de algo agradável ou desagradável tal como tem ocorrido — o qual foi um fato — e que se acha armazenado no cérebro; e está o que se faz agora — também um fato — tido por passado, controlado, moldado pelo ontem. Posso, pois, ver todo este movimento como um fato? A totalidade do movimento: o futuro, o presente e o passado.

PJ: O vê-lo como um fato é vê-lo sem um clichê.

K: Sem um clichê, sem nenhum preconceito, sem nenhuma distorção.

PJ: Sem nada que o rodeie.

K: Correto. Que significa isso, então?

PJ: Negar, antes que mais nada, todas as respostas que surgem em torno das recordações.

K: Negar as recordações. No momento, atenha-se a isso.

PJ: As recordações que aparecem...

K: ...desde o fato da semana passada, ao fato do prazer ou dor, de recompensa ou castigo. Bem, agora, é possível negar essas recordações?

PJ: Sim, é possível.

K: É possível. Por quê?

PJ: Porque, a atenção mesma...

K: Dissipa a recordação, o conhecimento. Um incidente ocorreu na semana anterior. Pode o cérebro estar tão atento como para não seguir recordando-o? Meu filho morreu e eu tenho sofrido. Mas a recordação desse filho tem tanta força em meu cérebro, que estou recordando-o constantemente. Aparece e desaparece, porém está aí. Então, pode o cérebro dizer: “Sim, meu filho está morto; se findou”?

PJ: Diz-se isso, ou quando há um surgir dele...

K: Há, então, um findar? O qual implica um interminável surgir e terminar.

PJ: Não, mas há um surgir...

K: ...que é uma recordação. Atenhamo-nos a essa palavra.

PJ: Sim, que é uma recordação. A partir disso há um movimento de dor. A negação dessa dor coloca fim não só a dor senão também ao surgir.

K: O que isso implica? Investiguemos um pouco mais. Meu filho está morto. Recordo todas as coisas que ele fazia, etc. A fotografia dele está sobre o piano ou sobre a borda da chaminé, e prossegue esta constante recordação, fluindo e refluindo. Isso é um fato.

PJ: Mas, a negação dessa dor e a dissolução dessa recordação, não tem uma ação direta sobre o cérebro?

K: A isso estou chegando. O que significa isso? Meu filho está morto; isso é um fato. Não posso mudar um fato. Ele se foi para sempre. Pode soar cruel dizê-lo, mas é assim. Sem dúvida, o levo comigo todo o tempo. O cérebro o contém como memória, e a recordação está sempre aí. Eu nunca digo: “Está morto. Isso é um fato”. Vivo na recordação, a qual é uma coisa morta. As recordações não são o real. Bem, agora, o findar do fato — “Meu filho está morto” — não significa que lhe perdi o amor nem muito menos. Meu filho está morto; isso é um fato.

PJ: Mas, o que resta quando um fato é percebido?

K: Posso dizer algo sem que seja chocante? Não resta nada. Meu filho está morto; meu irmão ou minha esposa — seja quem for — está morto. Isto não é uma afirmação de crueldade nem é a negação de meu afeto, de meu amor. Não é amor ao meu filho, senão a identificação do amor, com meu filho. Não sei se estou...

PJ: Você traça uma distinção entre “amor ao meu filho”...

K: E “amor”.

PJ: ...e “amor”.

K: Então, se amo a meu filho no mais profundo sentido da palavra, amo ao homem; amo a humanidade. Não é só que “amo a meu filho”, senão que amo à totalidade do mundo humano; amo a terra, as árvores, as estrelas, todo o universo. Mas esse é um assunto diferente. Estávamos nos formulando uma pergunta realmente boa, a saber: O que ocorre quando há percepção pura, a percepção de um fato — sem nenhuma predileção, sem nenhum tipo de fuga, etc.? E, é possível ver o fato completamente? Quando me oprime a dor da morte de um filho, me sinto perdido. É uma grande comoção; ocorreu algo terrível. Nesses momentos você não pode dizer-me nada. A medida que eu vá saindo desta confusão, deste sentimento de solidão, desespero e tristeza, talvez serei sensível o bastante como para perceber este fato.

PJ: Você não pode dizer a uma pessoa que acaba de perder a...

K: Não, não, isso seria cruel. Mas um homem que diz: “Meu filho está morto, o que é que tudo isso implica?”... um homem assim é sensível, inquire, investiga. Está desperto. Quer encontrar uma resposta a tudo isto.

PJ: Senhor, em um nível isto parece tão simples...

K: Eu sei. E penso que devemos mantê-lo simples e não gerar um montão de teorias intelectuais e ideias a respeito.

PJ: A mente tem medo de ser simples?

K: Não, penso que é porque somos sumamente intelectuais; isso tem formado parte de nossa educação, de nossa cultura. As ideias são tremendamente importantes; os conceitos são essenciais.

PJ: Senhor, em todo o campo da cultura indiana, o supremo é a dissolução do “eu”. E você fala da dissolução do fato — que é, em essência, a dissolução do “eu” — como se fosse algo muito simples.

K: Sim, mas a dissolução do “eu” tem se tornado um conceito, e nós estamos venerando um conceito, tal como as pessoas o fazem em todo o mundo. Os conceitos são inventados pelo pensamento, pela análise, etc. Chega-se a um conceito e se aferra a esse conceito como se fosse a coisa mais extraordinariamente importante. Voltemos, pois, ao ponto. O que fará que os seres humanos em todo o mundo se comportem apropriadamente? Não matar. Não ter medo. Amar. Sentir um grande afeto, etc. O que fará isso? Nada tem conseguido sucesso. Compreende? O conhecimento não tem ajudado.

PJ: Não é porque o medo acompanha ao homem com sua sombra?

K: O medo... também queremos conhecer o futuro.

PJ: O qual forma parte do medo.

K: Sim. Queremos conhecê-lo, porque — isto é bastante simples — temos buscado a segurança de múltiplas maneiras e todas têm fracassado. E agora dizemos: “Tem que haver segurança em alguma parte”. E eu coloco em dúvida que haja segurança alguma em nenhuma parte, nem sequer em Deus, porque esse “Deus” é uma projeção de nossos próprios medos.

PJ: Que ação exerce esta dissolução sobre as células cerebrais, sobre o cérebro mesmo?

K: Eu usaria a palavra “discernimento”. O discernimento direto não é uma questão de memória, não é um assunto de conhecimento e tempo, o que é tudo pensamento. Eu diria que o discernimento direto é a ausência completa de todo o movimento do pensar enquanto tempo e recordação; portanto, há percepção direta, instantânea. É como se estivesse indo para o Norte durante os últimos dez mil anos; meu cérebro está acostumado a ir para o Norte, e vem alguém e diz: “Isso não leva a nenhuma parte. Vá para o Leste”. Quando ou a volta e me dirijo para o Leste, as células cerebrais sofrem mutação. O expressarei de outra maneira. Todo movimento do pensar é limitado. Sem dúvida, o pensamento, em todas as partes do mundo, é considerado a coisa mais importante. Estamos manipulados pelo pensamento. Mas o pensamento não resolverá nenhum de nossos problemas, exceto os problemas tecnológicos. Se vejo isso, deixo de ir para o Norte. E penso que, no final de uma determinada direção — de um movimento que tem prosseguido durante milhões de anos —, nesse instante, há um relâmpago de discernimento que dá origem a uma mudança, a uma mutação nas células cerebrais.

Você vê isto muito claramente e pergunta: o que é que fará que outros mudem, que a humanidade mude? Que fará que mude meu filho, minha filha? Eles ouvem tudo isto, leem alguma coisa a respeito, dita pelos biólogos, pelos psicólogos, etc., e, não obstante, continuam a seu próprio modo. É tão forte o passado, a tradição? Tenho pensado acerca de mim mesmo durante os últimos mil anos e ainda sigo pensando em mim mesmo: “Tenho que me realizar”, “Tenho que ser importante”, “Tenho que chegar a ser isto ou aquilo”. Este é meu condicionamento; está é minha tradição. E o passado está se encarnado a todo tempo. Forma parte de nossa cultura continuar nesta condição?

PJ: Eu diria que sim, que forma parte de nossa cultura.

K: A cultura talvez forme parte de nossos impedimentos. Os conceitos religiosos talvez sejam nosso obstáculo. Então, o que o cérebro há de fazer? Dizem os especialistas que uma parte de nosso cérebro é velha e outra parte do cérebro é algo totalmente novo, e que se você for capaz de abrir a porta ao ovo, poderá haver uma mutação. Porque, conforme a estes especialistas, só estamos usando uma parte muito, muito pequena de nosso cérebro.

PJ: Obviamente, quando há atenção...

K: ...a totalidade do cérebro...

PJ: ...o fragmento termina.

K: É assim. Podemos falar acerca disso, podemos descrever o que á a atenção, podemos investigá-lo, etc. Mas ao final disso, o que nos escuta diz: “Muito bem. Compreendo tudo isto, mas sou o que sou. Compreendo isto intelectualmente, verbalmente, mas isso não tem tocado a profundidade de meu ser”.

PJ: Mas, não é uma questão desse primeiro contato com o pensamento na mente?

K: Lamento, não captei isto.

PJ: Eu sinto, senhor, que falamos acerca de observar o pensamento, o qual é algo completamente diferente do verdadeiro estado de atenção.

K: Ou seja, que o pensamento se dá conta de si mesmo. Temo que estejamos nos afastando disto, que é uma questão muito central. O mundo está se tornando mais e mais superficial, cada vez mais interessado em dinheiro. Dinheiro, poder, posição, realização, identificação: eu, eu, eu! E isto é encorajado por todo canto que nos rodeia. E bem, você que tem viajado, que também tem visto tudo isto, que faz a respeito? Estão estas pessoas extraordinárias, inteligentes — mais bem engenhosas — e as pessoas sumamente tolas, neuróticas, que tem chego a uma conclusão e jamais se movem dessa conclusão, como ocorre como comunistas.

PJ: Pode-se estabelecer contato unicamente com pessoas que não estão comprometidas.

K: Há pessoas que não estejam comprometidas com algo?

PJ: Eu diria que atualmente esse é o único sinal de saúde: pessoas que não estão comprometidas.

K: São pessoas jovens?

PJ: Hoje, como nunca antes nos últimos vinte ou trinta anos, há pessoas que não se acham comprometidas com nada.

K: Eu questiono isso.

PJ: Não, realmente, senhor, eu diria que sim. Por um lado, vê-se esta tremenda deterioração de todas as coisas, e por outro, em alguma parte está este movimento longe de todo compromisso. Essas pessoas talvez não saibam para onde se voltarem, que direção tomar, mas não pertencem a nada.

 K: Há pessoas assim, eu sei. Mas você logo vê, se voltam mais bem indefinidas, confusas.

PJ: Sim, porque convertem estas coisas em conceitos.

K: Concordo.

PJ: è muito fácil converter em um conceito o que você disse, e ter axiomas que contenham o que você expressa.

K: É claro, é claro.

PJ: Se é possível uma cultura humana, que talvez pudesse ser a cultura da mente, posso perguntar o que ocorre, em um estado assim, com todas as civilizações que o mundo tem conhecido?

K: Estão mortas. Considere, por exemplo a civilização egípcia.

PJ: Não, podem haver morrido, mas seguem estando contidas na raça humana. E quando você elimina...

K: Isso, Pupul, levanta a pergunta: o que é a liberdade? Nos damos conta de que somos prisioneiros de nossas próprias fantasias, imaginações, conclusões, ideias? Estamos conscientes de tudo isso?

PJ: Penso que estamos.

K: Pupul, se nos damos conta, se estamos atentos a tudo isso, isso se queima, se consome.

PJ: Mas não termina, senhor. Isto, sem dúvida, desaparece, mas em algum ponto donde não podemos... o que ocorre, é que você não deixa margem para um estado intermediário.

K: Isso é impossível.

PJ: Vê? Este é todo o problema.

K: “Intermediário”... é como um homem violento que trata de ser não violento; no estado “intermediário” é violento.

PJ: Não, não necessariamente. Veja, isso também não é um problema de todo este movimento do tempo?

K: Tempo é pensamento, etc. E o que implica isso? Limitação. Se tão só pudéssemos reconhecer ou ver o fato de que o pensamento — em qualquer direção, em qualquer campo: cirurgia, tecnologia, computadores e também na investigação interna — é limitado, veríamos que nossa investigação também será muito, muito, muito limitada.

PJ: Sim, senhor, mas a diferença está em que eu poderia ver isso, mas a atenção necessária para que isso permanecesse vivo em minhas horas de vigília, não existe.

K: Eu sei.

PJ: O que é o quantum, a capacidade, a força dessa atenção que...?

K: Você pergunta como se tem essa paixão, esse sustentado movimento de energia que não seja dissipado pelo pensamento, por nenhum tipo de atividade? Creio que isso só chega quando você compreende a dor e o findar da dor. Então advém a compreensão e o amor e a inteligência, que constituem a energia que não se debilita, esse estado ao qual não afetam nenhuma das qualidades humanas.

PJ: Você quer dizer que não ascende nem descende?

K: Não. Para que ascenda ou descenda, você deve estar consciente de que há ascensão e descensão. E quem é o que está consciente, etc.?

PJ: É possível, durante o dia, sustentar esta paixão?

K: Está aí! Você não a sustenta. É como um perfume que está aí. Por isso penso que se deve compreender todo o condicionamento de nossa consciência. Creio que esse é o verdadeiro estudo, a verdadeira investigação e exploração: penetrar em nossa própria consciência, que é o solo compartilhado por toda a humanidade. Jamais a investigamos e estudamos — não é que devamos fazê-lo tal como um professor ou um psicólogo inquirem e estudam. Jamais dizemos: “Vou estudar esta consciência que sou eu. Vou investigá-la”

PJ: Eu não poderia dizer que se não o faz; se disse que...

K: Mas não o faz.

PJ: Se o faz.

K: Parcialmente.

PJ: Eu não aceitarei isso, senhor. Se o faz, participa, investiga.

K: E então, o quê?

PJ: E então, subitamente...

K: Você já chegou até o findar disso?

PJ: Não, subitamente se descobre que tem se estado desatento.

K: Não, eu não creio que a desatenção importe. Talvez, se esteja cansado. Seu cérebro tem investigado bastante e pode ser que se diga: “Por hoje é suficiente”. Bem, não há nada de mal nisso. Veja, eu faço objeção a este assunto da atenção e da desatenção.

PJ: Mas esse é o problema básico da maioria de nossas mentes.

K: Não, eu não o expressaria desse modo. Eu só diria que, quando existe este findar de algo — totalmente —, há um novo começo, o qual tem seu próprio ímpeto. Isso não tem nada a ver com você. Significa que se deve estar completamente livre do “eu”. E estar livres do “eu” é uma das coisas mais difíceis que há, porque esse “eu” se oculta debaixo de diferentes rochas, diferentes árvores, diferentes atividades.

Brockwood Park
24 de junho de 1983
Fogo na Mente
_____________________________________________
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...
"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill