Quando a sociedade está edificada
sobre o egoísmo, sobre a rude competição, quando um luta contra o outro para a
sua própria segurança, como se dá no edifício da presente civilização, então,
essa ordem social deve a seu tempo ruir. O homem, movido pela sua ânsia de
posse, construiu aquilo que ele denomina civilização. E apega-se a esse mundo;
e, naturalmente, um edifício baseado no desejo contínuo, na consecução
constante de alturas vazias, tem que a seu tempo desmoronar.
Qual é o remédio? Não há panaceias
mundiais. Podeis, porém, individualmente e, portanto, coletivamente, pular fora do
sistema que é seu inevitável produto.
No mundo da ação, o homem, como indivíduo, tem-se tornado rudemente agressivo
em seu desejo pelos haveres, em sua busca pela segurança. Tem-se servido de sua
mente para lisonjear seus desejos egoístas. Ora, eu digo que necessitais pensar
integralmente por vós próprios e libertar-vos de toda a imitação, que precisais
manter a integridade de vossa individualidade em pensamento e sentimento. Só
por esse meio pode haver a espontaneidade da verdadeira cooperação no mundo da
ação, no trabalho coletivo em benefício de todos.
No buscar o que é eterno está o
verdadeiro trabalho por todos, baseado nas necessidades humanas, não na cobiça
e exploração humanas. Quando vós, pessoalmente, derrubardes esta estreiteza do
patriotismo, da nacionalidade, de bandeiras tremulantes e de guerras; quando
vós, individualmente, deixardes de ser exploradores em virtude de vossa força e
habilidade egoísta, então vos virá a paz e o entendimento pelos quais agora vos
esforçais em vão.
Haveis construído um sistema, um
edifício que denominais civilização e essa civilização baseia-se na segurança
individual; de modo que, no mundo da ação está o indivíduo constantemente
buscando segurança para si próprio e para os seus. Esta civilização foi
construída pelos homens através dos séculos, no decorrer dos quais o indivíduo
se tornou semelhante a um animal selvagem, lutando pelo seu próprio bem estar,
segurança e haveres; ao passo que, espiritualmente, isto é, no mundo do
pensamento, o indivíduo completamente se deu a si próprio à autoridade, à
obediência e à imitação e aí se tornou ele como um cordeiro, tendo perdido por
completo a sua integridade individual. Aí ele é irresponsável e vive num mundo
de ilusões; no entretanto é aí que ele tem de libertar sua mente e coração, por
completo, de toda a autoridade, de todas as limitações nascidas do desejo, quer
material quer espiritual.
Ora, como disse, necessitais
inverter por completo o processo. No mundo da vida diária, isto é, da existência
cotidiana, deveis formar planos para o conjunto e não para o indivíduo em
particular. Não deveis sustentar nacionalidades e fronteiras, porém sim
preocupar-vos com o conjunto dos homens, não como uma raça ou classe
particular. Isto só pode ter lugar quando não mais se houver de seguir
cegamente a autoridade. Só por esse meio será produzida a verdadeira cooperação
reta, o planejamento reto no mundo da ação.
Quando vós como indivíduos, não
mais fordes os dentes de engrenagem na máquina da sociedade; quando cessardes
de explorar e ser explorados; quando não vos entregardes à autoridade; quando
vos libertardes de todas as tradições que estropiam vossa mente e coração;
quando cessardes a busca da felicidade, da verdade, por intermédio de outrem,
então tornar-vos-eis plenamente responsáveis na ação e criareis assim um
entendimento da vida baseado na verdade e na liberdade.
Krishnamurti em, Palestras pela rádio, Canadá, 1932