Pergunta: A minha pergunta “como eu posso amar a todos igualmente?”
haveis respondido “não é amor que deveis sentir, porém algo de mais elevado”.
Por favor, explicai.
Krishnamurti: Penso que o
inquiridor deve ter compreendido mal o que eu disse. Enquanto houver a ideia
dos “muitos eus” em vossa consciência, em vosso apercebimento, admitis a
separação e quereis estar unidos a certas coisas — animais, árvores, seres
humanos e deuses. Quando não mais sois limitados pela eu-consciência, que cria
a separação, há o amor que é completo em si mesmo. Quando pensais em amor,
pensais em outros para quem esse amor se dirige? Se assim for, ainda há
divisão, incompletude. O amor não conhece pessoas nem coisas, nem sujeito, nem
objeto; está liberto da eu-consciência. Não se trata de amar a todos, porém
sim, de realizar a completude do amor que não conhece distinção.
Não ocupeis vossa mente com o
desejo de amar a todos. Isto conduz à hipocrisia, ao desagrado, ao autoengano.
Se estiverdes vivendo com intenso apercebimento, através dessa própria intensidade
virá o desapego, o qual não é indiferença, porém, sim, amor.
Pergunta: Esforçando-me por me desapegar, penso que estou me tornando
indiferente, o que verifico ser perfeitamente contrário daquilo que tendes em
vista. Ao vos perguntar como posso ser afetuoso e realmente interessado pelos
outros e ao mesmo tempo permanecer desapegado, talvez esteja perguntando algo
que devera me esforçar por descobrir por mim mesmo? Se assim é, compreendo que
não respondais à minha pergunta.
Krishnamurti: Quereis
saber como permanecer desapegados e, ao mesmo tempo, estar realmente interessados
pelos outros. Porque haveis de vos interessar pelos outros? Deixai os outros em
paz. Penso que tempo virá em que não mais necessitarei de pregar-vos e em que
vós não mais pregareis a outrem. Necessitais
ser naturais. Naturalidade não quer dizer intromissão para com outras
pessoas. Temais uma flor como exemplo: ela
é. Uma flor é tranquila, repousada, indiferente à vossa admiração. Do mesmo
modo não é o caso de ser afetuoso ou estar realmente interessado pelos outros.
Isto conduz à indiferença. Vós vos preocupais de como afetais aos outros.
Quereis que eles vos admirem, que vos animem, que digam que sois generosos, que
sois amáveis. Eu vos falo de qualquer coisa totalmente diferente na qual o outro não
existe. A ideia de outro é criada pela eu-consciência. Para perceber
aquilo que está isento de ilusões, necessitais compreender esta ilusão de
separatividade, necessitais
sofrer — não porque seja necessário, porém porque vós o quereis. A
indiferença existe enquanto estiverdes apegados, é o outro lado da moeda.
Quando houver verdadeiro desapego, isto é, completude, não há mais indiferença.
Quando estiverdes apegados, sereis escravos da reação e daí provém a fadiga, a
calorosa indiferença. O amor não conhece a outrem e, em seu êxtase, não há separação.
Krishnamurti, reunião de verão em Ommen, 1931