Estudante: Diz o senhor que a
liberdade é perigosa para o homem. Por que motivo?
Krishnamurti: Porque é perigosa?
Você sabe o que é a sociedade?
Estudante: É um grande número de
pessoas a ditar-nos normas de procedimento.
Krishnamurti: É isso mesmo. Mas é
também a cultura, os costumes, os hábitos de determinada comunidade; a
estrutura social, moral, ética, religiosa em que o homem vive, eis o que se
chama geralmente de sociedade. Porém, se cada indivíduo dessa sociedade agir
como lhe aprouver, ela o considerará um elemento perigoso. Se vocês fizessem o
que quisessem aqui, na escola, o que aconteceria? Representariam um perigo para
o próprio colégio, não concordam? As pessoas em geral não gostam que os outros
sejam livres. O homem realmente livre, não com relação às ideias, mas
interiormente liberto da avidez, da ambição, da inveja, da crueldade, é
considerado pelos demais como um ser perigoso, por diferir totalmente do
indivíduo comum. Então, a sociedade o adora ou o aniquila, ou lhe demonstra
indiferença.
Estudante: Disse o senhor que a
liberdade e a ordem nos são necessárias, mas como alcança-las?
Krishnamurti: Antes de tudo,
vocês não devem depender de outrem; não esperem que alguém lhes dê liberdade e
ordem — nem pai, nem mãe, nem marido, nem mestre. Consiga-as vocês mesmos. Esta
é a primeira coisa que precisam compreender: não peçam nada a ninguém, exceto
alimentos, roupa e abrigo. É inútil rogar, ou apelar para quem quer que seja,
seus gurus, seus deuses. Ninguém pode proporcionar-lhes liberdade ou ordem. Por
conseguinte, compete-lhes criar ordem em si próprios. Isso significa que vocês
mesmos devem pesquisar e descobrir o que é ser virtuoso. Sabem o que é virtude
— ter moralidade, ser bom. Virtude é ordem. Assim, cumpre descobrirem,
individualmente, como serem bondosos, afáveis, solícitos. E é dessa solicitude,
desse zelo, que procede a ordem, e, portanto, a liberdade. Vocês dependem de
outros para dizer-lhes o que devem fazer, isto é, não olharem pela janela,
serem pontuais, serem bondosos. Porém, se disserem: “olharei pela janela quando
quiser, mas, ao estudar, toda a minha atenção será consagrada ao livro”,
criarão ordem dentro de si, independentemente da orientação alheia.
Estudante: Que ganhamos em sermos
livres?
Krishnamurti: Nada. Se nos
preocuparmos com o que vamos ganhar, na realidade, estamos pensando em termos
de negócio. Vou fazer isto e, em troca, dê-me alguma coisa. Sou bondoso com
você porque me convém. Mas isso não é bondade. Enquanto nos preocuparmos apenas
com o ganho, não seremos livres. Se você pensar: “Se eu obtiver liberdade,
poderei fazer isto ou aquilo”, isso não será liberdade. Não pensem, pois, em
termos de utilidade. Se o fizer, eliminará completamente a possibilidade de ser
livre. A liberdade só existe quando a temos sem nenhum objetivo. Não amamos uma
pessoa porque ela nos dá alimento, roupa ou abrigo, pois isto não é amor.
Costumam passear sozinhos? Ou
saem sempre com outras pessoas? Se às vezes andam sós, terão então a oportunidade
de conhecer-se, de saber o que pensam, o que sentem, o que é virtude, o que
desejam ser. Descubram-no. E vocês não poderão compreender-se se estiverem
sempre falando, a passear com os amigos e continuamente acompanhados. Sentem-se
quietos sob uma árvore, mas sem nenhum livro. Apenas olhem as estrelas, o céu
límpido, os pássaros, o contorno das folhas. Observem a sombra. Acompanhem o
pássaro atravessando o céu. Em solitude, tranquilos, sentados sob uma árvore,
começarão então a compreender a mente em atividade e a importância de
frequentar as aulas.
Krishnamurti — Ensinar e Aprender
— ICK