Nossa mente está afeiçoada à rotina, à repetição, à imitação, à conformidade; nada mais conhece, além disso. Se percebe alguma coisa, logo quer transformá-la em ocorrência diária. Isso é bem evidente, não é? Ninguém o nega. É um fato psicológico, observável em nossa vida diária.
Pois bem, como pode a mente, que é o único instrumento que possuímos, deixar de ser mecânica? Em primeiro lugar, quantos de nós já fizemos está pergunta? Ou, quantos de nós estamos conscientes deste problema? Pouquíssimos. Agora, que eu o apresento, e que estais conscientes dele, qual é a vossa reação? Observo todo esse processo, e sei alguma coisa mais? Não sei, evidentemente. Isto é, se eu dissesse que há alguma coisa mais, essa coisa seria ainda um processo de pensamento, que é uma projeção do passado no presente. Este problema é muito complexo, porque nele está compreendido todo o processo de dar nome, a aplicação dos símbolos, a importância das palavras, não só neurologicamente, mas também psicologicamente, não só no nível consciente, mas também no nível mais profundo. Eis o fator de degeneração.
Pode a mente, que tão habituada está a funcionar mecanicamente, deter-se? Esse mecanismo tem de parar, antes que possais achar uma resposta. Se “projetais” a resposta, de acordo com Marx, de acordo com o Bhagavad Gita, sois então repetitivo e destrutivo. Pode a mente, que funciona há séculos, parar? O “eu” é o resultado de todo o ser humano, ou, melhor, de toda a espécie humana, e a mente é o envoltório do “eu”. Pode parar esse processo da mente, esse mecanismo tão astucioso, tão voraz, tão intensamente exigente, tão poderoso? Isto é, pode ele findar? Se não pode, não achareis a resposta.
Se utilizais a mente, estais apenas dando continuidade ao pensamento como meio de alcançar alguma coisa. Tende a bondade de observar. Se estais cansado, não continueis a escutar. Se não estais cansados, observai apenas. Pode esse mecanismo que tem funcionado através de gerações, através de séculos, deter-se voluntariamente, isto é, sem ser forçado, sem ser constrangido, compelido? Quando um homem é constrangido, sua reação será de persistência no mesmo estado, e, portanto, uma reação do pensamento.
Como poderá a mente findar-se? Eis uma questão importante, mas não sabeis resolvê-la. A mente precisa ser detida, a fim de que possa saltar ao outro lado. Não podeis deixa-la funcionar mecanicamente, e dar o salto. No conjecturar é o passado que está reagindo, e não há nada de novo. A mente tem de terminar. Mas, como é possível isso? Está certa está pergunta? O “como” é importante. Estão conseguindo acompanhar-me?
Sabemos que a mente é mecânica; logo em seguida vem a reação “como detê-la?” No momento em que fazeis esta pergunta, a mente se torna mecânica. Estais percebendo? Isto é, desejo um resultado, tenho os meios para alcança-lo e ponho em prática esses meios. Que aconteceu? O “como” é a reação da mente mecânica, reação do velho; e o seguir e praticar o “como”, é a continuação da máquina. Vede como se tornou falso o nosso pensar. Estamos sempre preocupados com o passado, o “como”, a maneira, a prática, etc. Estais vendo o processo. O “como” é vazio, e a mente indagadora se transforma, com efeito, na velha mente repetitiva, pela prática desse “como”.
Há dois estados mentais diferentes: o que segue o “como” e o que investiga sem procurar um resultado. A mente que investiga e prossegue em sua indagação, só nos poderá ser útil. Investigar e visar a um resultado são dois estados inteiramente diversos. Pois bem. Qual é o estado da vossa mente: o de buscar um resultado, ou o de investigar? Se estais em busca de resultado, estais apenas agindo mecanicamente. Nesse caso, nunca haverá um fim. Isso leva à deterioração e a destruição, é óbvio.
Vossa mente está de fato investigando, com o fim de encontrar a resposta sobre se a mente pode terminar, e não com o fim de descobrir “como” fazê-la terminar? O “como” é inteiramente diferente do “pode”. Pode a mente terminar? Já fizestes esta pergunta a vós mesmos? Se já a fizestes, com que motivo, com que intenção, com que fim a fizestes? É muito importante isso. Se fizestes a pergunta “pode a mente terminar?”, tendo por motivo o desejo de um resultado, do qual estais bem conscientes, então, nesse caso estais de novo no processo mecânico. Precisais, pois, ser extraordinariamente vigilantes e sutis, para poderdes responder a esta pergunta — não para mim, mas para vós mesmos. Se realmente fizerdes a pergunta sem a intenção de ver o que acontece, se investigardes, vereis que a vossa mente não estará à procura de um resultado, mas, sim, esperado uma resposta; não estará especulando sobre a resposta; não estará desejando a resposta; não estará ansiando pela resposta; estará simplesmente à espera.
Vede, faço-vos uma pergunta: qual é a vossa reação? Vossa reação imediata é a de pensar, de raciocinar, de olhar, de descobrir um argumento inteligente, para responder. Pergunta e resposta são uma ação psicológica diariamente observável, verbal e psicologicamente. Isto é não estais respondendo, estais reagindo, estais apresentando razões; em outras palavras, estais procurando uma resposta. Quando desejai achar a resposta a uma pergunta, a reação é mecânica, diferente do estado de espera. Isto é, a mente que fica à espera de uma resposta, não é mecânica, pois a resposta tem de ser algo que se desconhece; a resposta que se conhece é mecânica. Mas se se vos faz a pergunta e ficais “esperando” a resposta, vereis que a vossa mente se acha, então, num estado inteiramente diferente. Esperar é mais importante do que responder. Estais compreendendo? Aí, a mente já não é mecânica, mas um processo inteiramente diferente; é uma coisa inteiramente nova, que surge na existência, sem ter sido solicitada.
Krishnamurti - 2 de fevereiro de 1952
Quando o pensamento cessa - ICK
Krishnamurti - 2 de fevereiro de 1952
Quando o pensamento cessa - ICK